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Title:
METHOD FOR OBTAINING FULLY HYDROGENATED BUTTEROIL, FULLY HYDROGENATED BUTTEROIL THUS OBTAINED, AND USE THEREOF
Document Type and Number:
WIPO Patent Application WO/2020/142823
Kind Code:
A2
Abstract:
The present invention concerns the field of food products, more specifically dairy products and production thereof, and describes the method for obtaining fully hydrogenated butteroil (GALTH) from full milk from ruminants. This invention also relates to the fully hydrogenated butteroil (GALTH) obtained and the use thereof in food products; in the production of milk chocolate, the composition of which requires milk fat; cosmetics and pharmaceutical products. The addition thereof to the formulation of milk chocolate, in place of the milk fat normally used, results in a product with greater thermal stability, that does not melt at normal storage and sale temperatures, and that does not produce fat bloom during storage.

Inventors:
GIGANTE MIRNA LÚCIA (BR)
RIBEIRO ANA PAULA BADAN (BR)
EFRAIM PRISCILLA (BR)
QUEIRÓS MAYARA DE SOUZA (BR)
VIRIATO RODOLFO LÁZARO SOARES (BR)
VAUGHAN JULYANA LAURA MEDEIROS (BR)
Application Number:
PCT/BR2020/050004
Publication Date:
July 16, 2020
Filing Date:
January 09, 2020
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Assignee:
UNICAMP (BR)
Attorney, Agent or Firm:
MOUTINHO BARBOSA, Raquel (BR)
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Claims:
RE IVINDICAÇÕES

1. PROCESSO DE OBTENÇÃO DE GORDURA ANIDRA DE LEITE TOTALMENTE HIDROGENADA (GALTH) caracterizado pelo fato de ser a partir de leite integral de ruminantes e por compreender as etapas de:

a) Pasteurização de um creme de leite obtido a partir do desnate parcial ou total do leite integral de ruminantes; o creme de leite compreende teor de gordura na faixa de 35 a 45%; ser realizada em uma faixa de temperatura compreendida entre 85 e 95°C, por um intervalo de tempo compreendido entre 5 e 15 segundos, preferencialmente, 85°C / 15 segundos;

b) Pré-concentração do creme obtido na etapa (a) para obtenção de um creme concentrado; o creme de leite pasteurizado ser aquecido a uma temperatura que varia de 55 a 65 °C e alimentado em um separador com aceleração centrífuga de 4000 a 6000 g, com posterior separação do leitelho; o creme concentrado compreende teor de gordura na faixa de 70 a 85%;

c) Homogeneização do creme concentrado obtido na etapa (b) ; o creme ser aquecido a uma faixa de temperatura compreendida entre 55 e 65°C sob uma faixa de pressão compreendida entre 500 e 2000 psi;

d) Centrifugação para obtenção de uma gordura do leite; a centrifugação final ser realizada com aceleração centrífuga compreendida na faixa de 4000 a 6000 g; a centrifugação final ser realizada em separador; o leitelho separado na etapa (d) retornar para a etapa (b) ; a gordura obtida ao final da etapa (d) compreender teor de gordura na faixa de 98 a 99,5%; e) Secagem da gordura obtida na etapa (d) a vácuo para obtenção da gordura anidra do leite (seca e desaerada) ; a gordura ser pulverizada em câmara de vácuo dual a uma faixa de temperatura compreendida entre 90 e 150°C, sob uma faixa de pressão compreendida entre 0,2 e 5 bar;

f) Hidrogenação total da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) ; a gordura ser completamente saturada em um reator de hidrogenação com pressão de hidrogénio compreendida na faixa de 2 a 10 bar, temperatura compreendida na faixa de 210 a 250 °C, na presença de um catalisador de reação, com posterior resfriamento da gordura em uma faixa de temperatura compreendida entre 60 e 80°C, preferencialmente a 65°C; o catalisador de reação compreender níquel metálico e platina; o catalisador de reação ser, preferencialmente, níquel metálico, de 0,02 a 0,1 % (m/m); o resfriamento poder ser realizado no próprio reator de hidrogenação ou em trocador de calor;

g) Deniquelagem da GALTH obtida na etapa (f); ser realizada em um dispositivo de filtração para remoção de níquel, sob as seguintes condições processuais: temperatura compreendida na faixa de 90 a 110°C, preferencialmente a 100 °C, vazão média compreendida na faixa 250 a 450 litros/m2/hora, preferencialmente à 300 litros/m2/hora, tempo para enchimento do tanque do filtro compreendido entre 5 e 10 minutos, preferencialmente à 10 minutos, tempo de recirculação até início da filtração compreendido na faixa de 5 a 10 minutos, preferencialmente à 10 minutos, tempo de filtração compreendida entre 1 a 2 horas, dependente da configuração e capacidade do dispositivo de filtração, tempo de drenagem do filtro compreendido entre 5 e 10 minutos, preferencialmente 10 minutos; h) Clarificação da GALTH deniquelada obtida na etapa (g) as condições no tanque de mistura serem: pressão de 0,05 a 0,15 bar; temperatura de 70 a 90°C; tempo de residência de 5 minutos e concentração de terra clarificante, natural ou ativada, de 0,2 a 2,0%; e i) Desodorização da GALTH obtida na etapa (h) , pode ser realizada em um mesmo equipamento ou (conjunto de equipamentos), podendo ser utilizados desodorizadores ou destiladores contínuos ou semi-contínuos , ou qualquer outro equipamento (ou conjunto de equipamentos) que seja capaz de remover os compostos de oxidação e ácidos graxos livres e compreende as seguintes subetapas :

11) pré-aquecimento ocorre em uma faixa de temperatura compreendida entre 90 e 120°C, preferencialmente 100°C, sob vácuo de 1 a 4 mbar por um intervalo de tempo compreendido entre 10 a 30 minutos ;

12) desodorização ocorre pela injeção de vapor por um desodorizador ou destilador contínuo ou semi- contínuo.; ser injetado de 0,5 a 4,0% de vapor, preferencialmente 2 %, em relação à massa de desodorizado; quando a injeção de vapor é realizada por um desodorizador ou destilador, as condições compreendem uma faixa de temperatura compreendida entre 220 a 270°C, preferencialmente 240°C, uma faixa de pressão compreendida entre 1 e 4 mmHg, preferencialmente 3 mmHg, por um período de tempo compreendido por 20 minutos a 3 horas, condicionado a configuração do desodorizador ou destilador utilizado;

13) resfriamento ocorre sob vácuo 1 a 4 mbar) em uma faixa de temperatura compreendida entre 50 e 150 °C, preferencialmente 60 °C, por um intervalo de tempo compreendido entre 15 e 30 minutos, preferencialmente por 30 minutos; e

14) filtração filtração ocorre em dispositivo de filtração para separação de qualquer material particulado .

2. Processo, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de as condições no clarificador serem: pressão de 0,05 a 0,15 bar; temperatura de 90 a 120°C e tempo de contato de 5 a 30 minutos.

3. Gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) caracterizada pelo fato de ser obtida conforme processo descrito nas reivindicações 1 e 2 e por compreender composição de ácidos graxos heterogénea, variando de 4 a 24 carbonos ( C4 a C24), e ponto de fusão de 46°C (iniciando a fusão em 7 °C e finalizando em 52°C) .

4. Gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , de acordo com a reivindicação 3, caracterizada pelo fato de promover a estruturação de produtos gordurosos com maior resistência térmica e sem a presença de gorduras trans.

5. Gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , de acordo com a reivindicação 3, caracterizada pelo fato de modular processos de cristalização de diferentes sistemas lipidicos.

6. Uso da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , conforme definido nas reivindicações de 3 a 5, caracterizada pelo fato de ser em produtos alimentícios, cosméticos e farmacêuticos.

7. Uso da GALTH, de acordo com a reivindicação 6, caracterizado pelo fato de ser na preparação de micropartículas lipídicas sólidas (I) ; bases lipídicas (II) e Nanopartículas lipídicas (III); incluindo Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS) e carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN) .

8. Micropartículas lipídicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 8 e 9, caracterizada por compreender a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) conforme definida na reivindicação 3, em que as referidas micropartículas são totalmente sólidas, com ponto de fusão compatível com a aplicação em alimentos, sem a percepção de residual ceroso durante o consumo, e totalmente de origem láctea .

9. Micropartículas lipídicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 8, caracterizada por compreender diâmetro médio de 120,4 a 211,3 mm, formato esférico e superfície lisa .

10. Micropartículas lipídicas sólidas (I), de acordo com as reivindicações 8 e 9, caracterizada pelo fato de quando a referida micropartícula é armazenada a 05 °C, esta apresenta predominância do polimorfo b', e a tendência de formação de cristais b após 60 dias de estocagem (Figura

11a) .

11. Micropartículas lipidicas sólidas (I), de acordo com as reivindicações 8 e 9, caracterizada pelo fato de quando a referida micropartícuia é armazenada em uma faixa de temperatura compreendida entre 15 e 25 °C, estas apresentam um início de transição polimórfica para b' sub b.

12. Uso das Micropartículas lipidicas sólidas (I), conforme definida nas reivindicações 8 a 11, caracterizado pelo fato de ser utilizada na modulação de processos de cristalização (seeding) na indústria de óleos e gorduras para fins alimentícios, cosméticos e fármacos.

13. Uso da Micropartículas lipidicas sólidas (I), conforme definida nas reivindicações 8 a 11, caracterizado pelo fato de ser na veiculação de compostos bioativos, micro- organismos probióticos, prebióticos, aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia e fármacos.

14. Uso da Micropartículas lipidicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 13, caracterizado pelo fato de o composto bioativo ser selecionado do grupo compreendido por compostos lipofílicos e hidrofílicos com diferentes graus de solubilidade, preferencialmente lipofílicos, e de qualquer outro composto que apresente atividade bioativa, para aplicação em alimentos, fármacos e cosméticos.

15. Uso da Micropartículas lipidicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 13, caracterizado pelo fato de o prebiótico ser selecionado do grupo compreendido por ingredientes dietéticos não digeríveis que afetam beneficamente o hospedeiro estimulando seletivamente o crescimento e/ou atividade de bactérias no cólon, melhorando assim a saúde do hospedeiro.

16. Uso da Micropartículas lipidicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 13, caracterizado pelo fato de os aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia serem selecionados do grupo compreendido por qualquer substância que enquanto tal não se consome normalmente como alimento, nem tampouco se utiliza como ingrediente básico em alimentos, tendo ou não valor nutritivo, e cuja adição intencional ao alimento com fins tecnológicos (incluindo os organolépticos ) em suas fases de fabricação, elaboração, preparação, tratamento, envasamento, empacotamento, transporte ou armazenamento, resulte ou possa preservar razoavelmente por si, ou seus subprodutos, em um componente do alimento ou um elemento que afete suas caracteristicas (por exemplo estabilizantes, antiumectantes , antioxidantes , aromatizantes, realçadores de sabor, corantes, espessantes, quelantes) .

17. Uso da Micropartículas lipidicas sólidas (I), de acordo com a reivindicação 13, caracterizado pelo fato de o fármaco ser selecionado do grupo compreendido por compostos lipofilicos e hidrofilicos com diferentes graus de solubilidade e pureza, preferencialmente lipofilicos.

18. Bases lipidicas (II), caracterizada por compreender a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , conforme definida na reivindicação 3, isoladamente ou em conjunto com outros óleos e gorduras disponíveis para fins alimentícios, farmacêuticos e cosméticos.

19. Bases lipidicas (II), de acordo com a reivindicação 18, caracterizada por compreender gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e óleo de girassol alto oleico ( GALTH :OGAO % m/m) .

20. Bases lipidicas (II), de acordo com a reivindicação 18, caracterizada por compreender gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e gordura anidra do leite (GALTH:GAL % m/m) nas proporções 100:0; 90:10; 80:20; 70:30; 60:40; 50:50 (Figura 12) .

21. Bases lipidicas (II), de acordo com a reivindicação 20, caracterizada pelo fato de que quando a referida base lipidica compreende gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e gordura anidra do leite na proporção GALTH:GAL igual a 100:0 % m/m), estas apresentam como principais ácidos graxos os ácidos miristico (C 14:0); palmitico (C 16:0) e esteárico (C 18:0) .

22. Bases lipidicas (II), de acordo com as reivindicações 18 a 21, caracterizada pelo fato de que as referidas bases apresentam compatibilidade total entre os seus constituintes, ampla faixa de fusão e cristalização, resistência à exsudação de óleo, capacidade de conferir estrutura a produtos à base de lipídeos, com características de fusão apropriadas à temperatura corporal.

23. Uso das bases lipidicas (II), conforme definida nas reivindicações 18 a 22, caracterizado pelo fato de ser para proporcionar maior resistência térmica e mecânica em formulações lipidicas, alimentos de base lipidica, fármacos e cosméticos.

24. Uso das bases lipidicas (II), conforme definida em qualquer uma das reivindicações 18 a 22, caracterizado pelo fato de ser para substituir, parcial ou totalmente, a fase lipidica de base láctea de chocolates ao leite, podendo ser misturadas com manteiga de cacau e sucedâneos, a exemplo de equivalentes, substitutos ou melhoradores .

25. Uso das bases lipidicas (II), conforme definida em qualquer uma das reivindicações 18 a 22, caracterizado pelo fato de ser na preparação de lipídios estruturados por interesterificação via química e enzimática.

26. Uso das bases lipídicas (II), conforme definida em qualquer uma das reivindicações 18 a 22, caracterizado pelo fato de ser na preparação de Nanopartículas lipídicas (III) selecionadas do grupo compreendido por Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS), carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN) e nanoemulsões .

27. Carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), caracterizados por a base lipidica (II) ser GALTH:GAL (% m/m), nas proporções 70:30 e 50:50.

28. Carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), de acordo com a reivindicação 27, caracterizados pelo fato de que quando a base lipidica (II) é GALTH:GAL (% m/m) na proporção 70:30, as somatórias de ácidos graxos saturados e insaturado são, respectivamente 90,75 e 9,25 ( % ) , com ponto de fusão de 42,66°C.

29. Carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), de acordo com a reivindicação 27, caracterizados pelo fato de que quando a base lipidica (II) é GALTH:GAL (% m/m) na proporção 50:50, as somatórias de ácidos graxos saturados e insaturado são, respectivamente 84,97 e 15, 03 ( % ) , com ponto de fusão de 40,86°C.

30. Carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), caracterizados por a base lipidica (II) ser GALTH:OGAO (% m/m) nas proporções 70:30 e 50:50.

31. Carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), de acordo com a reivindicação 30, caracterizados pelo fato de que quando a base lipidica (II) é GALTH:OGAO (% m/m) na proporção 70:30, as somatórias de ácidos graxos saturados e insaturado são, respectivamente 72, 62 e 23,38 ( % ) , com ponto de fusão de 42,99°C .

32. Carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN) , de acordo com a reivindicação 30, caracterizados pelo fato de que quando a base lipidica (II) é GALTH:OGAO (% m/m) na proporção 50:50, as somatórias de ácidos graxos saturados e insaturado são, respectivamente 54,94 e 45, 06 (%) , com ponto de fusão 40, 55°C .

33. Carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN), de acordo com as reivindicações 30 a 32, caracterizados por compreender cristais somente na forma b e apresentar diâmetro médio inferior a 200 nm.

34. Carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN), de acordo com as reivindicações 27 a 29 caracterizados por compreender equilíbrio entre os polimorfos b e b' quando preparados, exclusivamente, a partir de fontes lácteas.

35. Uso dos carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN), conforme definidos nas reivindicações 27 a 34, caracterizado pelo fato de ser na preparação de formulações infantis, de embalagens ou filmes (comestíveis ou não) , de ração animal, lipossomas e fármacos, dentre outros.

36. Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS), caracterizadas por a fase lipidica ser, exclusivamente, GALTH .

37. Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS), de acordo com a reivindicação 36, caracterizadas por as somatórias de ácidos graxos saturados e insaturado serem, respectivamente 99, 40 e 0 , 60 ( % ) , com ponto de fusão de 46, 34°C e diâmetro médio compreendido entre 135, 6 e 140 mm.

38. Uso da Micropartículas lipidicas sólias (NLS), conforme definida nas reivindicações 36 e 37, caracterizado pelo fato de ser na preparação de formulações infantis, de embalagens ou filmes (comestíveis ou não) , de ração animal, lipossomas e fármacos, dentre outros.

39. GORDURA ANIDRA DO LEITE TOTALMENTE HIDROGENADA caracterizada por compreender composição de ácidos graxos heterogénea, variando de 4 a 24 carbonos ( C4 a C24), e ponto de fusão de 46°C (iniciando a fusão em 7 °C e finalizando em 52 ° C ) .

40. Uso da Gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) conforme descrita nas reivindicações 3, 4, 5 e 39 caracterizado pelo fato de ser em chocolate ao leite.

Description:
PROCESSO DE OBTENÇÃO DE GORDURA ANIDRA DO LEITE TOTALMENTE HIDROGENADA, GORDURA ANIDRA DO LEITE TOTALMENTE HIDROGENADA

ASSIM OBTIDA E USO DA MESMA

Campo da invenção :

[1] A presente invenção se insere no campo dos produtos alimentícios, mais especificamente, produtos de laticínios e produção dos mesmos, e descreve o processo de obtenção de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) a partir de leite integral de ruminantes, gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) e uso da gordura.

[2] Ainda, esta invenção provê a referida GALTH e o seu uso em produtos alimentícios, especialmente na produção de chocolate ao leite, que utiliza, obrigatoriamente, gordura do leite em sua composição, cosméticos e farmacêuticos, devido à sua resistência térmica e mecânica.

[3] Sua adição na formulação do chocolate ao leite, em substituição à gordura do leite normalmente utilizada, resulta em um produto com maior estabilidade térmica, que não derrete nas temperaturas usuais de armazenamento e comercialização e que não apresenta fat bloom durante o armazenamento .

Fundamentos da invenção:

[4] De acordo com Lands (2005), a demanda por gorduras para fins alimentícios aumentou de 52 para 104 milhões de toneladas entre os anos de 1980 e 2000, podendo atingir 184 milhões de toneladas entre 2016 e 2020.

[5] Isso ocorre devido ao fato de, além de constituírem nutrientes importantes na dieta humana, os óleos e gorduras fornecem plasticidade e características de fusão específicas para diversos produtos alimentícios. [6] Ainda, sistemas lipidicos semissólidos para uso industrial devem apresentar plasticidade adequada para a aplicação à qual se destina. A plasticidade de uma base lipidica expressa a relação entre os conteúdos de gordura sólida e liquida no sistema a uma dada temperatura e depende, consequentemente, da capacidade da estrutura cristalina de aprisionar a gordura liquida no sistema.

[7] A cristalização dos lipídios e o aprisionamento de gordura líquida na rede cristalina é afetada pela composição química da matriz lipidica, pela cinética de cristalização, pela forma cristalina obtida e pela sua estabilidade.

[8] Antigamente, o processo de obtenção de sistemas lipidicos semissólidos com plasticidade adequada era apenas possível através da hidrogenação parcial de óleos vegetais, em um processo que promove a redução no grau de insaturação e o aumento do ponto de fusão do material inicial.

[9] Desta forma, variando-se o grau de hidrogenação, é possível a obtenção de gorduras com os mais variados níveis de sólidos, que atendam qualquer característica desejável em bases lipídicas para diferentes aplicações industriais.

[10] Este processo, no entanto, leva à formação de altas concentrações de isômeros trans, que são indesejáveis uma vez que ácidos graxos trans encontram-se entre os lipídios associados a fatores de risco de doenças, tais como doença arterial coronariana e a diferentes desordens metabólicas e funcionais .

[11] Assim, muitos estudos são conduzidos visando à produção de sistemas lipidicos semissólidos livres de ácidos graxos trans.

[12] Na busca de uma solução tecnológica, surgiram os hardfats, ou seja, novos materiais lipidicos obtidos a partir da hidrogenação total de diferentes óleos vegetais. Esses materiais, isentos de isômeros trans, são obtidos através do processo clássico de hidrogenação catalítica total, que consiste na adição direta de hidrogénio nas duplas ligações na cadeia dos ácidos graxos do triacilglicerol .

[13] Os óleos vegetais líquidos, quando submetidos à hidrogenação total catalítica, resultam em produtos totalmente saturados, com composição em triacilglicerol homogénea e elevado ponto de fusão (PF) . O elevado ponto de fusão resulta da saturação dos ácidos graxos insaturados de cadeia longa, especialmente com 18 átomos de carbonos, presentes maj oritariamente nos óleos vegetais, que são convertidos em ácido esteárico cujo ponto de fusão médio é de 69,6 °C.

[14] Estes materiais lipidicos com pontos de fusão variando entre 59 e 72°C têm uma aplicação tecnológica bastante restrita em sistemas alimentícios, pois podem apresentar aspecto ceroso e sensação desagradável na boca.

[15] Com menor ponto de fusão (36 °C) , acreditava-se que o óleo de palmiste totalmente hidrogenado seria uma alternativa promissora no desenvolvimento de sistemas lipidicos semissólidos . No entanto, a aplicação tecnológica desta gordura láurica é limitada, devido ao seu elevado conteúdo de triacilgliceróis de 36 átomos de carbono, que, em condições de hidrólise, promovem percepção sensorial de sabor de sabão. Além disso, do ponto de vista nutricional, o ácido láurico é o ácido graxo de maior efeito inflamatório, conforme comprovado.

[16] Uma possível solução seria a misturas de óleos totalmente hidrogenados e óleos vegetais. No entanto, quando duas classes de lipídios de composição química tão distinta, como óleos e óleos totalmente hidrogenados são misturadas, as propriedades físico-químicas da mistura não são necessariamente as mesmas que as dos componentes originais, ocasionando incompatibilidade.

[17] Diferentemente, esta invenção provê a gordura do leite totalmente hidrogenada (GALTH) . Enquanto os óleos vegetais apresentam em média 15 diferentes ácidos graxos na sua composição química, a gordura do leite apresenta aproximadamente 400 ácidos graxos que variam em comprimento de cadeia, posição e número de insaturações e ramificações. A gordura do leite é caracterizada pelo alto teor de gordura saturada (aproximadamente 65%), triacilgliceróis com vasta gama de peso molecular (de 28 a 56 átomos de carbono) e diferentes tamanhos de cadeia de ácidos graxos (de C4 a C18) .

[18] Essa composição é o que permite que a gordura do leite apresente uma extensa faixa de fusão (-40 a 40 °C) e ponto de fusão médio de 36°C. A ampla variabilidade do ponto de fusão resulta em uma gordura naturalmente plástica, com comportamento de fusão, de cristalização e hábito polimórfico únicos.

[19] Através do processo de hidrogenação da GAL, se obtém a GALTH com composição de ácidos graxos extremamente heterogénea (C4 a C24) e ponto de fusão de 46°C, a qual consegue estruturar produtos gordurosos, promovendo alta resistência térmica e sem a presença de gorduras trans .

[20] Estas características o diferenciam de qualquer óleo totalmente hidrogenado de origem vegetal e lhe conferem a capacidade de modular os processos de cristalização de diferentes sistemas lipidicos.

[21] Assim, o mesmo pode ser aplicado em produtos alimentícios, para estruturação de gorduras, e também em produtos cosméticos e farmacêuticos. Diferentemente, os óleos vegetais totalmente hidrogenados usados atualmente têm alto ponto de fusão e causam sensação cerosa na boca.

[22] Embora microbiologicamente estável por suas características de composição e produção, a vida de prateleira do chocolate é usualmente limitada por uma modificação física do sistema, ao nível de sua estrutura molecular, que resulta em um chocolate com aparência esbranquiçada indesejável. Tecnologicamente, este defeito é conhecido como fat bloom. O fat bloom representa um grande problema para indústria de chocolates, com impacto comercial importante para os fabricantes. Este defeito afeta adversamente não só os atributos visuais, mas também a textura dos produtos, uma vez que promove a formação de superfícies não-uniformes, com aparência desagradável de mármore (uniformemente acinzentado) ou com pontos brancos, que juntamente com a falta de brilho superficial causam a rejeição do produto pelo consumidor.

[23] Apesar do mecanismo específico pelo qual este fenômeno ocorre ainda ser desconhecido, a teoria mais aceita é a de que o fat bloom seja formado devido à transição polimórfica da manteiga de cacau durante a estocagem do produto, sendo que fatores como a mistura de gorduras incompatíveis com a manteiga de cacau, a temperagem inadequada do chocolate durante a fabricação e flutuações de temperatura durante a estocagem, têm sido relacionados por diferentes autores ao seu aparecimento (ROUSSEAU, 2007; BECKETT , 2008; DAHLENBORG et al . , 2011) .

[24] Durante a fabricação do chocolate, mais especificamente na etapa de temperagem, inicia-se o processo de cristalização da manteiga de cacau, com a formação de 2 a 4% de cristais na forma polimórfica bn. Durante o resfriamento, esses cristais serão responsáveis pela nucleação que dará origem a uma rede cristalina estável que caracteriza a estrutura molecular do chocolate. O fat bloom seria o resultado da transição polimórfica de bV bVI (LOISEL et al . , 1998) que ocorre quando se tem o aumento da mobilidade molecular do sistema. O aumento dessa mobilidade pode ocorrer com a flutuação da temperatura durante o armazenamento do chocolate.

[25] A gordura anidra do leite (GAL) é um ingrediente comumente utilizado para a fabricação do chocolate ao leite. Devido sua complexa composição química e propriedades físicas únicas, a GAL, quando misturada à MC, resulta na redução do conteúdo de gordura sólida e no amolecimento da MC, conferindo maior mobilidade molecular ao sistema e favorecendo a transição do polimorfo bV bVI . O fracionamento da gordura do leite e a utilização da fração de maior ponto de fusão (estearina) foi explorado por diferentes autores (LUCCAS, BONOMI e KIECKBUSCH, 2014; MARANGONI , 2005; PAJIN e JOVANOVIC, 2005) como uma solução para inibir o fat bloom. No entanto, o fracionamento economicamente viável para obtenção da estearina, por conter parte de oleína oclusa, não foi suficiente para inibir a mobilidade molecular do sistema. Baseado nessa premissa, nossa hipótese foi que a gordura do leite totalmente hidrogenada pudesse aumentar a estabilidade físico-química do sistema e evitar mobilidade molecular necessária para a transição do polimorfo bV bVI e o aparecimento do fat bloom.

[26] A gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) do pedido de patente BR 10 2019 000428-2 tem ponto de fusão 46 °C, apresenta resistência térmica e mecânica às flutuações de temperaturas normalmente associadas ao fat bloom. Estas caracteristicas a diferenciam de qualquer outro material lipidico utilizado na fabricação de chocolate ao leite com potencial para conferir caracteristicas sensoriais desejáveis, com ausência de residual ceroso.

[27] O chocolate é definido como uma dispersão de aproximadamente 70% de partículas finas de cacau em pó, açúcar e sólidos do leite, completamente envolvidos por uma fase lipídica contínua (FERNANDEZ et ai., 2013) . A fase lipídica contínua é maj oritariamente composta por manteiga de cacau, sendo permitida sua substituição parcial por outras gorduras alternativas, que no geral são gorduras vegetais modificadas por interesterificação enzimática com a finalidade de mimetizar as propriedades físicas da manteiga de cacau e baratear o custo do produto (BISWAS et al., 2017) .

[28] As etapas típicas de processamento do chocolate são mistura dos ingredientes, refino, conchagem, temperagem, moldagem, resfriamento, desmoldagem e embalagem. A mistura inicia-se com os ingredientes em pó e com aproximadamente 20% da gordura total, sendo realizada em misturadores encamisados, com temperatura entre 40 e 45 °C, por tempo suficiente para formar uma massa homogénea e de consistência plástica. A fase lipídica utilizada para a fabricação de chocolate ao leite é composta de manteiga de cacau (MC) e de aordura do leite, comumente referida como gordura anidra do leite (GAL) após sua extração, concentração e purificação. Ambas as gorduras são bastante complexas e diferentes. A MC é composta basicamente por três ácidos graxos, que são os ácidos palmitico (C16:0), esteárico (C18:0) e oleico (C18:l), e apresenta ponto de fusão entre 35-37 °C (RIBEIRO, BASSO e KIECKBUSCH, 2013) . Em consequência disso, a manteiga de cacau apresenta três principais triacilgliceróis : POP ( 1 , 3-dipalmito-2-óleo triacilglicerol ) , POS ( l-palmito-2- óleo-3-estearo triacilglicerol) e SOS ( 1 , 3-diestearo-2-óleo triacilglicerol) . Juntos, eles respondem por cerca de 75% dos triacilgliceróis da manteiga de cacau ou 90% dos triacilgliceróis monoinsaturados . Em função desta simetria, a manteiga de cacau se cristaliza com alto grau de organização estrutural, apresentando seis diferentes formas polimórficas , denominadas como g (I), a (II), b' (III), b' (IV), b (V) e b (VI), apresentadas em ordem crescente de estabilidade térmica e ponto de fusão (LUCCAS e KIECKBUSCH, 2006; BUSCATO et al . , 2018) . A forma cristalina U (I) se forma quando a gordura é submetida a um rápido resfriamento em baixas temperaturas e apresenta menor estabilidade e ponto de fusão. Após um reaquecimento lento, rapidamente transforma-se para a forma b (V) , passando antes pelas formas OÍ (II), b' (III) e b' (IV) ( CHAPMAN, 1971) . A transição da forma b (V) para b (VI) é muito lenta comparada com as demais, podendo levar até 4 meses para a completa transformação, sendo acelerada por flutuações de temperatura. Ao contrário das demais transições que ocorrem no estado liquido, a transformação da forma b (V) para b (VI), ocorre no estado sólido (WILLE e LUTTON, 1966) . [29] Em contrapartida, a GAL apresenta mais de 400 diferentes ácidos graxos, dos quais aproximadamente 65% são saturados e apenas 15 estão presentes em concentrações maiores do que 1%. Os ácidos graxos saturados predominantes são o miristico (C14:0), palmitico (C16:0) e esteárico (C18:0) e o ácido graxo insaturado predominante é o ácido oleico ( Cl 8 : 1 ) (MACGIBBON e TAYLOR, 2006) . Essa composição em ácidos graxos resulta em uma possibilidade de 64 milhões de combinações de triacilgliceróis , que se dividem em três grupos diferentes: os de baixo, médio e alto ponto de fusão. Essa variabilidade de composição em triacilgliceróis permite que a GAL apresente uma ampla faixa de temperatura de fusão, variando de -40 a 40 °C. A GAL pode cristalizar em três formas polimórficas , denominadas a, b ' e b, em ordem crescente de estabilidade térmica e ponto de fusão (WRIGHT e MARANGONI, 2006) . No entanto, devido sua alta concentração de ácido palmitico ( ~35% ) e aos triacilgliceróis assimétricos a GAL se cristaliza predominantemente na forma polimórfica b ' ( TIMMS , 1984; SCHENK e PESCHAR, 2004; MARTINI , AWAD e MARANGONI, 2006) .

[30] Não é difícil imaginar que a mistura dessas duas gorduras para compor a fase lipídica contínua do chocolate ao leite resulta em uma complexa interação entre os triacilgliceróis que afetam o comportamento de cristalização e a estabilidade do sistema físico-químico. No chocolate ao leite, a co-cristalização entre os triacilgliceróis (TAGs) da MC e da GAL é um fator chave que influencia a aparência e as propriedades físicas do produto. A quantidade de gordura do leite que pode ser adicionada ao chocolate é limitada pela incompatibilidade termodinâmica entre os TAGs da GAL e da MC no estado sólido. Devido às restrições geométricas moleculares e às condições de processo que influenciam a cinética de cristalização, os TAGs da MC e da GAL não formam cristais mistos, mas sim cristalizam de forma separada como gordura do leite e como manteiga de cacau. Assim, quando duas classes de lipídios de composição química tão distintas, são misturadas, as propriedades físico-químicas da mistura não são necessariamente as mesmas que as dos componentes originais, podendo resultar na incompatibilidade, que pode promover a formação de um sistema eutético. A formação deste sistema eutético leva a uma diminuição na dureza do chocolate ao leite (MARANGONI , 2005; TIMMS , 1984; HIMAWAN, STAROV e STAPLEY, 2006) . Estudos da compatibilidade de misturas binárias de GAL e MC têm revelado que essas interações podem resultar em um efeito eutético e na limitada solubilidade dos triacilgliceróis (TIMMS, 1980; METIN, 1997; MARANGONI, 2005) . No chocolate ao leite, o efeito eutético é decorrente da incompatibilidade entre os triacilgliceróis de baixo ponto de fusão da gordura de leite e os triacilgliceróis simétricos da manteiga de cacau. Timms (1980) construiu diagramas de fase e isosólidos de misturas binárias de MC e GAL, e observou a formação de um sistema eutético em adições maiores que 30% de gordura do leite devido ao efeito dos triacilgliceróis líquidos (baixo ponto de fusão) , causando o amolecimento da manteiga de cacau. No estudo de Metin (1997), a cristalização da manteiga de cacau com a gordura do leite afetou o comportamento de fases e o teor de gordura sólida dessas misturas binárias. Em altos níveis de adição de gordura do leite (30-50%), houve efeito eutético, com discreta diminuição no ponto de fusão. Marangoni (2005) também observou um efeito eutético na adição de 30 % de GAL na MC, com diminuição da dureza da manteiga de cacau.

[31 ] Uma vez que os triacilgliceróis de baixo ponto de fusão da gordura do leite são os responsáveis pelo amolecimento do chocolate, uma estratégia tecnológica para compor a fase lipidica do chocolate ao leite poderia ser o fracionamento da GAL para remoção da fração oleina, que é composta pelos triacilgliceróis de baixo ponto de fusão, e a concentração da fase estearina, que apresenta ponto de fusão mais alto que a GAL, para ser misturada à MC. Algumas pesquisas mostraram que a estearina da gordura do leite é compatível com a manteiga de cacau, podendo ser adicionada ao chocolate para aumentar o ponto de fusão e a dureza do produto, além de ajudar a inibir a formação do fat bloom (MARANGONI , 2005; PAJIN e JOVANOVIC, 2005; LUCCAS, BONOMI e KIECKBUSCH, 2014) . Os resultados obtidos por Pajin e Jovanovic (2005) indicam que a adição da fração estearina da gordura do leite retardou o aparecimento de fat bloom em chocolate, devido ao aumento do conteúdo de gordura sólida que possivelmente diminuiu as transformações polimórficas , evitando que a manteiga de cacau alcançasse a forma mais estável (b VI ) . Nenhum efeito eutético foi observado por Marangoni (2005) ao misturar a fração de alto ponto de fusão da gordura do leite (estearina) com a MC. Por outro lado, Bystrom e Hartel (1994) relataram incompatibilidade com formação de sistema eutético nas misturas compostas também por estearina da gordura do leite e manteiga de cacau. Este efeito foi decorrente do tipo de fracionamento realizado. Neste estudo, o fracionamento térmico não foi suficiente para separar totalmente as frações, de forma que quantidades significativas de triacilgliceróis de baixo e médio ponto de fusão ainda estavam presentes na fração estearina. Luccas, Bonomi e Kieckbusch (2014) relataram que a adição da fração estearina em chocolate ao leite retardou o desenvolvimento de fat bloom quando comparado com o chocolate padrão, porém não foi suficiente para inibi-lo, atingindo o mesmo índice de brancura do chocolate ao leite padrão após 120 dias de armazenamento. Da mesma forma que ocorrido no estudo citado anteriormente, a presença de fração oleína oclusa, de menor ponto de fusão, aumentou a mobilidade molecular e favoreceu a migração da b V à b VI formando cristais mais estáveis e maiores (~4 e 5 mm) , que são perceptíveis durante o consumo do produto e consequentemente promovem a formação do fat bloom. Quanto mais pura for a fração estearina, maior é seu ponto de fusão e maior é a possibilidade de que a sua adição afete positivamente a estabilidade do chocolate. No entanto, estearinas puras somente são obtidas por fracionamentos subsequentes a temperaturas mais altas (BONOMI, LUCCAS, e KIECKBUSCH, 2012) . Assim, embora tecnologicamente viável, a obtenção da estearina pura é economicamente inviável devido aos baixos rendimentos.

[32] Outras opções atualmente estudadas para retardar o aparecimento do fat bloom é o uso de modificadores de cristalização. Buscato et ai., 2018 utilizaram de forma individual estearina da manteiga de cacau e monoestearato de sorbitana (SMS) como modificadores da cristalização da manteiga de cacau. A formação do fat bloom foi evitada durante os 90 dias de estocagem a 20 °C, no entanto, sob oscilação de temperatura (ciclos de 24 h alternando entre 20 e 32 °C) a adição 0,15% de SMS ou de 6% de estearina da manteiga de cacau retardou o fat bloom somente por 15 e 45 dias, respectivamente .

[33] Diante desses fatores múltiplos e complexos, a utilização dos hardfats, que são obtidos pela hidrogenação total de óleos vegetais, também podem atuar como indutores da cristalização da manteiga de cacau nas formas polimórficas desejadas. Pesquisa realizada por Ribeiro, Basso e Kieckbusch (2013) apresentou a influência de hardfats de óleos como modificadores da cristalização da manteiga de cacau e foi observado que esses hardfats foram efetivos em relação à cinética de solidificação e comportamento térmico, antecipando de forma expressiva o processo de cristalização e promovendo maior resistência térmica e dureza para as formulações. O uso de hardfats como moduladores lipidicos no processo de obtenção de chocolates resolveria os problemas de temperagem insuficiente, cristalização incompleta, nucleação heterogénea durante o resfriamento, instabilidade a flutuações de temperatura durante a estocagem e consequentemente e inibição do fat bloom. Portanto, a modificação do comportamento de cristalização em sistemas lipidicos, através da adição destes componentes, fundidos ou na forma sólida, consiste na diferenciação da ordenação estrutural do sistema (SATO, 2001; SVANBERG et ai., 2011) . No entanto, estes materiais lipidicos com elevado ponto de fusão (59 e 72 °C) têm aplicação tecnológica bastante restrita em sistemas alimentícios, pois podem apresentar aspecto ceroso e sensação desagradável na boca (RIBEIRO et ai. , 2010) .

[34] Diante de todos os fatores mencionados anteriormente, a utilização da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada como um modificador da cristalização da manteiga de cacau se mostrou uma técnica muito promissora, já que este ingrediente faz parte da formulação de um chocolate ao leite de alta qualidade. A gordura anidra do leite totalmente hidrogenada apresenta vantagens em relação a gordura do leite em sua forma natural. Além de diminuir o processo espontâneo de rancificação, proporcionando maior estabilidade oxidativa a esta matéria-prima, o processo de hidrogenação total promove o aumento do teor de gordura sólida, com maior ponto de fusão (46 °C) e considerável aumento em sua resistência mecânica a temperaturas altas. Estas caracteristicas a diferenciam de qualquer outro material lipidico utilizado em chocolate ao leite.

Estado da técnica :

[35] Alguns documentos do estado da técnica descrevem a gordura anidra do leite (GAL) como matéria prima para obtenção de manteiga; e obtenção de carreador lipidico nanoestruturado .

[36] O artigo de Findik e Andiç (2017), intitulado "Some Chemical and microhiological propertíes of the hutter and the hutter oil produced from the same raw material", verifica as propriedades químicas e microbiológicas de manteigas e gorduras anidras do leite obtidas a partir da mesma matéria prima bruta. A partir dos resultados, atribui-se à gordura anidra do leite muitas vantagens relativas à qualidade do produto e durabilidade.

[37] No artigo de 2013 de Zhang et al . , intitulado "Transparent Dispersions of Milk-Fat-Based Nanostructured Lipid Carriers for Delivery of b-Carotene" , são descritos carreadores lipidicos nanoestruturados compreendendo gordura de leite anidra e polissorbato, os quais apresentam maior estabilidade e baixa degradação do ativo sob armazenamento.

[38] No documento US 2,875,220, é descrito um processo de hidrogenação de gorduras que consiste em colocar a gordura liquida em contato com um catalisador de níquel em uma zona de catalisação. Em US 2007/0151480 Al, faz-se referência a produtos à base de óleos, tal como a gordura do leite, em que o processo de hidrogenação ocorre pela reação do óleo em uma determinada pressão de vapor de hidrogénio na presença de um catalisador.

[39] Nenhum dos documentos do estado da técnica relata a hidrogenação total ou parcial de uma gordura animal não refinada, tal como o leite integral. Ainda, esta invenção apresenta um avanço técnico ao propor a hidrogenação de um gordura não refinada, posto que a hidrogenação exige uma etapa de refinamento quando se trata de óleos vegetais. A grande maioria dos óleos e gorduras de origem vegetal apresenta uma série de componentes minoritários que devem obrigatoriamente ser removidos para que o consumo possa ser viabilizado. Estes compostos incluem: fosfolipidios, metais, hidrocarbonetos , compostos sulfurosos, ácidos graxos livres, pigmentos (clorofila e carotenoides ) , produtos oxidados, compostos aromáticos e de impacto sensorial negativo. Desta forma, o refino é realizado empregando-se, em geral, um conjunto de etapas, referentes aos: refino químico (degomagem, neutralização, clarificação e desodorização) ; ou refino físico (degomagem, clarificação e destilação) . Todos estes componentes indesejáveis inviabilizam tecnicamente o processo de hidrogenação direta de um óleo ou gordura, pois funcionam como venenos de catalisador, impedindo a reação de hidrogenação parcial ou total. Portanto, hardfats obtidos a partir de óleos e/ou gorduras vegetais requerem o refino total das matérias-primas de partida. No caso da GALTH, existe concentração mínima ou mesmo ausência destes compostos minoritários indesejáveis, que funcionariam impedindo a reação de hidrogenação. Desta forma, é possível a obtenção de uma gordura totalmente hidrogenada sem o uso do processo de refino como pré-processamento.

[40] O material lipídico objeto dessa invenção é obtido a partir de uma modificação química da gordura anidra do leite, que resulta em um material de composição, comportamento térmico de fusão e cristalização, polimorfismo e ponto de fusão totalmente diferente do que pode ser encontrado na própria gordura anidra do leite ou em qualquer outro material lipídico encontrado na natureza ou obtido por hidrogenação total .

Breve descrição da invenção:

[41] Esta invenção descreve o processo de obtenção de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada, a qual é obtida a partir de leite integral de ruminantes. Mais especificamente, refere-se à hidrogenação total da gordura anidra do leite não refinada.

[42] Também são objetos dessa invenção a gordura anidra de leite totalmente hidrogenada (GALTH) e o seu uso em produtos alimentícios, na produção de chocolate ao leite, que utiliza obrigatoriamente, gordura do leite em sua composição, cosméticos e farmacêuticos.

Breve descrição das figuras:

[43] Para obter uma total e completa visualização do objeto desta invenção, são apresentadas as figuras as quais se faz referências, conforme se segue.

[44] A Figura 1 é um diagrama de blocos que representa o processo de obtenção da GALTH a partir do creme de leite proveniente do leite integral.

[45] As Figuras 2A e 2B representam graficamente o comportamento térmico de cristalização (A) e fusão (B) do hardfat da gordura do leite (GALTH) , óleo de palmiste (OPtTH) , óleo de palma (OPTH) , óleo de soja (OSTH) e óleo de crambe (OCrTH) , respectivamente

[46] A Figura 3 representa graficamente o conteúdo de gordura sólida do hardfat da gordura do leite (o), do óleo de palmiste (□) , do óleo de palma (▲), do óleo de soja (X) e do óleo de crambe .

[47] A Figura 4 apresenta o aspecto visual da gordura anidra do leite (GAL) antes e após a hidrogenação total (GALTH) expostas a 25 C durante 15 horas.

[48] A Figura 5 apresenta um esquema geral dos exemplos de concretização referente às aplicações da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) em produtos alimentícios, cosméticos e farmacêuticos, a saber: (I) micropartículas lipídicas sólidas, (II) bases lipídicas e (III) nanopartículas lipídicas, compreendendo nanopartículas lipídicas sólidas (NLS) e carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN) ) .

[49] A Figura 6 apresenta um esquema geral de um exemplo de concretização referente à produção das micropartículas lipídicas sólidas (I) de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[50] A Figura 7 apresenta o aspecto visual das micropartículas lipídicas sólidas de GALTH, armazenadas em três diferentes temperaturas.

[51] A Figura 8 mostra a distribuição de tamanho e diâmetro médio (mm) das micropartículas lipidicas sólidas de GALTH, após 60 dias de estocagem a (A) 05 °C (B) 15 °C e (C) 25 °C.

[52] A Figura 9 apresenta as imagens obtidas por microscopia eletrónica de varredura das micropartículas lipidicas sólidas de GALTH, após 60 dias de estocagem a 05 °C, 15 °C e 25 °C.

[53] A Figura 10 mostra os termogramas de fusão das micropartículas lipidicas sólidas após 60 dias de estocagem a (A) 05 °C, (B) 15 °C e (C) 25 °C.

[54] A Figura 11 mostra os difratogramas de raios-x obtidos a 25 °C, das micropartículas lipidicas sólidas após 60 dias de estocagem a (A) 05 °C (B) 15 °C e (C) 25 °C.

[55] A Figura 12 mostra o esquema de um exemplo de concretização da invenção referente ao preparo das bases lipidicas GALTH : GAL e GALTH : OGAO (m/m %) .

[56] A Figura 13 indica o grau de saturação das bases lipidicas (a) GALTH: GAL e (b) GALTH: OGAO (m/m %) .

[57] A Figura 14 mostra o conteúdo de gordura sólida (%) das bases lipidicas (a) GALTH: GAL e (b) GALTH: OGAO (m/m %) ·

[58] A Figura 15 apresenta o diagrama de compatibilidade das bases lipidicas (a) GALTH: GAL e (b) GALTH: OGAO (m/m %) .

[59] A Figura 16 apresenta os termogramas de cristalização das bases lipidicas (a) GALTH:GAL e (b) GALTH: OGAO (m/m %) .

[60] A Figura 17 mostra os termogramas de fusão das bases lipídicas (a) GALTH : GAL e (b) GALTH : OGAO (m/m %) .

[61] A Figura 18 apresenta a isoterma de cristalização a 25 °C das bases lipídicas (a) GALTH: OGAO e (b) GALTH: GAL (m/m %) .

[62] A Figura 19 apresenta as imagens de microscopia sob luz polarizada das bases lipídicas GALTH:GAL (m/m %), após estabilização por 24 horas a 25 °C e a 40 °C, utilizando aumento de 20 e 4x, respectivamente .

[63] A Figura 20 apresenta as imagens de microscopia sob luz polarizada das bases lipídicas GALTH:OGAO (m/m %), após estabilização por 24 horas a 25 °C e a 40 °C, utilizando aumento de 20 e 4x, respectivamente.

[64] A Figura 21 mostra o aspecto visual das bases lipídicas GALTH: GAL e GALTH: OGAO (m/m %) expostas a 25 °C durante 120 min.

[65] A Figura 22 apresenta os difratogramas das bases lipídicas após 07 e 30 dias de estabilização a 25 °C, respectivamente .

[66] A Figura 23 mostra um esquema das formulações das Nanopartículas Lipídicas Sólidas (NLS) e Carreadores Lipídicos Nanoestruturados (CLN) compostos de (a) isolado proteico de soro (WPI) e (b) Caseinato de sódio (NaCas) .

[67] A Figura 24 apresenta um esquema de processo de obtenção das Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS) e carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN) emulsionadas por isolado proteico de soro (WPI) e caseinato de sódio (NaCas) .

[68] A Figura 25 apresenta as curvas de distribuição de tamanho de partículas das nanopartículas lipídicas (NL) ao longo do tempo de armazenamento a 25 °C. [69] A Figura 26 mostra o comportamento térmico de fusão e recristalização das nanopartículas lipidicas (NL) secas a 25 °C.

[70] A Figura 27 apresenta o conteúdo de gordura sólida a 25 °C das nanopartículas lipidicas emulsionadas com isolado proteico de soro (WPI) e caseinato de sódio (NaCas) . GALTH: gordura anidra do leite totalmente hidrogenada; GAL : gordura anidra do leite; OGAO: óleo de girassol alto oleico; G:G: GALTH: GAL; G : O : GALTH: OGAO. a,b Letras minúsculas diferentes entre os tipos de lipídeos apresentam diferença significativa pelo teste de Tukey (p < 0,05) . A, B Letras maiúsculas diferentes entre os tipos de emulsificantes apresentam diferença significativa pelo teste de Tukey (p < 0, 05) .

[71] A Figura 28 indica as mudanças no perfil de espalhamento de luz (% BS) das nanopartículas lipidicas (NL) , ao longo do tempo de armazenamento a 25 °C.

[72] A Figura 29 demonstra a variação dos valores de TSI {Turbiscan Stability Index) em função do tempo de armazenamento para as nanopartículas lipidicas estabilizadas com (a) WPI e (b) NaCas.

[73] A Figura 30 mostra o aspecto visual das nanopartículas lipidicas (NL) acondicionadas em tubos de vidro do Turbiscan, e estocadas durante 90 dias a 25 °C.

[74] A Figura 31 apresenta os difratogramas de raios-x obtidos a 25 °C, das nanopartículas lipidicas (NL) secas após 30 dias de estocagem a 25 °C.

[75] Na Figura 32 apresenta-se diagramas de compatibilidade de misturas binárias de (a) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de (b) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[76] Na Figura 33 apresenta-se o conteúdo de gordura sólida de misturas binárias de (a) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de (b) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[77] Na Figura 34 apresenta-se as isotermas de cristalização a 17,5 °C de misturas binárias de (a) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de (b) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[78] Na Figura 35 apresenta-se o comportamento térmico de cristalização de misturas binárias de (a) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de (b) manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[79] Na Figura 36 apresenta-se o difratograma de misturas binárias de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[80] Na Figura 37 apresenta-se a morfologia de misturas binárias de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) .

[81] Na Figura 38 apresenta-se o índice de brancura (%) do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH ao longo do tempo de estocagem sob ciclização térmica.

[82] Na Figura 39 apresenta-se a tensão de ruptura ( snap) do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH ao longo do tempo de estocagem sob ciclização térmica.

[83] Na Figura 40 apresenta-se o comportamento térmico de fusão do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH ao longo do tempo de estocagem sob ciclização térmica.

[84] Na Figura 41 apresenta-se os difratogramas do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH ao longo do tempo de estocagem sob ciclização térmica.

[85] Na Figura 42 apresenta-se a morfologia do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH ao longo do tempo de estocagem sob ciclização térmica.

[86] Na Figura 43 apresenta-se o aspecto visual do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH após 7 e 28 dias de estocagem sob ciclização térmica.

[87] Na Figura 44 apresenta-se o aspecto visual do chocolate ao leite produzido com GAL e do chocolate ao leite produzido com GALTH após 90 dias de estocagem a 20 °C sob condição controlada.

[88] Na Figura 45 apresenta-se as etapas de refino e de conchagem do chocolate ao leite adicionado de Gordura Anidra do Leite Totalmente Hidrogenada como modificador de cristalização da Manteiga de Cacau.

Descrição detalhada da invenção:

[89] A presente invenção faz referência a um processo de obtenção de gordura anidra de leite totalmente hidrogenada (GALTH) , a qual é obtida a partir de leite integral de ruminantes, cujo teor de gordura varia de 2,5 a 8 %.

[90] O processo de obtenção da GALTH da presente invenção é mostrado na Figura 1 e compreende as etapas de: a) Pasteurização de um creme de leite obtido a partir do desnate parcial ou total do leite integral de ruminantes, sendo que o referido creme compreende teor de gordura na faixa de 35 a 45%;

b) Pré-concentração do creme obtido na etapa (a) para obtenção de um creme concentrado, o qual compreende teor de gordura na faixa de 70 a 85%;

c) Homogeneização do creme concentrado obtido na etapa (b) ;

d) Centrifugação para obtenção de uma gordura do leite, a qual compreende um teor de gordura na faixa de 98 a 99, 5%;

e) Secagem da gordura obtida na etapa (d) a vácuo para obtenção da gordura anidra do leite (seca e desaerada) ;

f) Hidrogenação total da gordura anidra obtida na etapa (e) para obtenção da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) ;

g) Deniquelagem da GALTH obtida na etapa (f);

h) Clarificação da GALTH deniquelada obtida na etapa (g) e

i) Desodorização da GALTH obtida na etapa (h) , a qual compreende as subetapas a seguir:

11) pré-aquecimento da GALTH clarificada na etapa (h) ;

12) desodorização da GALTH obtida na subetapa (il);

13) resfriamento da GALTH obtida na subetapa (i2) sob vácuo; e

i4) filtração da GALTH obtida da subetapa ( i3 ) .

[91] Como um dos exemplos de concretização da presente invenção, a seguir está descrito uma das formas de se obter a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada a partir de leite integral de ruminantes.

[92] O creme de leite utilizado na etapa (a) é obtido a partir do desnate parcial ou total do leite integral de ruminantes por meio de um processo amplamente conhecido do estado da técnica, em que o leite integral é aquecido a uma temperatura que varia de 40 a 70°C e alimentado em uma centrífuga de prato para centrifugação e separação da gordura sob uma aceleração centrífuga que deve ser de 4000 a 6000 g. O leite obtido (desnatado, parcialmente desnatado ou padronizado) é separado e segue para outra linha de processamento, enquanto o creme de leite obtido segue para a etapa de pasteurização (a) .

[93] Na etapa (a), a pasteurização é realizada em trocador de calor a placas e a temperatura de pasteurização deve ser de 85 a 95 °C por 5 a 15 segundos (por exemplo, 85°C / 15 segundos ou 95°C / 5 segundos) . Esta etapa tem a finalidade de destruir microrganismos e inativar enzimas lipolíticas, garantindo a qualidade do produto final.

[94] Em seguida, o creme de leite pasteurizado é pré- concentrado (etapa b) em separador centrífugo de pratos. O creme é previamente aquecido a uma temperatura que varia de 55 a 65 °C e é alimentado no separador com aceleração centrífuga de 4000 a 6000 g para concentração de 70 a 85% de gordura. Ao final da etapa, o leitelho (o qual apresenta de 1 a 2% de gordura) é separado do creme. [95] Em seguida, a etapa (c) de homogeneização tem por finalidade promover a inversão de fase. A homogeneização é conduzida com o creme previamente aquecido a uma temperatura que varia de 55 a 65°C em homogeneizador a pistão, utilizando pressões de 500 a 2000 psi. Após a homogeneização, a mistura (gordura do leite e leitelho) é conduzida para centrifugação final (etapa d) .

[96] A centrifugação final é realizada em separador centrífugo de pratos (com aceleração centrífuga de 4000 - 6000 g) e tem a finalidade de separar a gordura do leite do leitelho. Após separado, o leitelho retorna para a etapa de pré-concentração do creme (etapa b) para recuperar ainda mais gordura. A gordura do leite, obtida após o processo de centrifugação final, segue para o sistema de secagem a vácuo.

[97] Na etapa (e) , a secagem da gordura a vácuo é realizada em câmara de secagem a vácuo para promover a desaeração e a remoção da água residual. A gordura é pulverizada na câmara de vácuo a uma temperatura que varia de 90 a 150°C, utilizando pressão de 0,2 a 5 bar. A gordura do leite seca e desaerada é, então, conduzida para um reator de hidrogenação .

[98] Na etapa de hidrogenação total (etapa f ) , as duplas ligações dos ácidos graxos são completamente saturadas em um reator de hidrogenação nas seguintes condições de processo: pressão de hidrogénio de 2 a 10 bar; temperatura de 210 a 250 °C e 0,02 a 0,1 % de níquel metálico como catalisador de reação. Alternativamente, poderia ser utilizado platina como catalisador, porém seu uso seria economicamente inviável.

[99] Diferentes sistemas de hidrogenação podem ser usados, tais como sistemas de hidrogenação por agitação ou por circulação. Após a hidrogenação total, a gordura totalmente hidrogenada é resfriada em uma faixa de temperatura compreendida entre 60 e 80°C, preferencialmente a 65°C, no próprio reator de hidrogenação ou em trocador de calor, sendo que a gordura resfriada segue para a etapa de denique1agem.

[100] Na etapa (g) , a deniquelagem é realizada em um dispositivo de filtração para remoção de níquel (por exemplo, filtros herméticos com vasos verticais ou horizontais, com placas metálicas ou em filtro tipo pulsante; ou em filtro tipo prensa contendo carvão ativo, com subsequente filtração em filtro de polimento / guarda) , sob as seguintes condições processuais: temperatura compreendida na faixa de 90 a 110°C, preferencialmente a 100 °C, vazão média compreendida na faixa 250 a 450 litros/m 2 /hora, preferencialmente à 300 litros/m 2 /hora, tempo para enchimento do tanque do filtro compreendido entre 5 e 10 minutos, preferencialmente à 10 minutos, tempo de recirculação até início da filtração compreendido na faixa de 5 a 10 minutos, preferencialmente à 10 minutos, tempo de filtração compreendida entre 1 a 2 horas, dependente da configuração e capacidade do dispositivo de filtração, tempo de drenagem do filtro compreendido entre 5 e 10 minutos, preferencialmente 10 minutos. Esta etapa tem por finalidade a separação de níquel metálico utilizado como catalisador de reação do produto hidrogenado. A gordura do leite totalmente hidrogenada deniquelada segue para a etapa de clarificação.

[101] Na etapa de clarificação (etapa h) , realizada em reator de clarificação, é utilizada terra clarificante natural ou ativada para remoção de cor e separação de níquel metálico residual. As condições utilizadas no tanque de mistura são: pressão de 0,05 a 0,15 bar; temperatura de 70 a 90°C; tempo de residência de 5 minutos e concentração de terra de 0,2 a 2,0%. Para o clarificador, as condições são: pressão de 0,05 a 0,15 bar; temperatura de 90 a 120°C e tempo de contato de 5 a 30 minutos.

[102] A remoção da terra clarificante e níquel residual complexado é realizada em dispositivo de filtração (por exemplo, filtros herméticos com vasos verticais ou horizontais, com placas metálicas ou filtro tipo pulsante; ou filtro prensa) . A gordura do leite totalmente hidrogenada, deniquelada e clarificada segue para a última etapa do processo, que é a desodorização .

[103] A etapa (i) de desodorização tem a finalidade de remoção de compostos de oxidação e ácidos graxos livres, ocorre em 4 subetapas e no mesmo equipamento, podendo ser utilizados desodorizadores ou destiladores contínuos ou semi-contínuos , ou qualquer outro equipamento (ou conjunto de equipamentos) que seja capaz de remover os compostos de oxidação e ácidos graxos livres. A subetapa (il) de pré- aquecimento, para recuperação de energia do processo, ocorre em uma faixa de temperatura compreendida entre 90 e 120°C, preferencialmente 100°C sob vácuo (1 a 4 mbar) , por um intervalo de tempo de 10 a 30 minutos. Em seguida, a desodorização (i2) , com o objetivo de retirada de ácidos graxos livre e compostos de oxidação, ocorre pela injeção de 0,5 a 4,0% de vapor, preferencialmente 2 %, em relação à massa de desodorizado, por um desodorizador ou destilador sob uma faixa de temperatura compreendida entre 220 a 270°C, preferencialmente 240°C, sob uma faixa de pressão compreendida entre 1 e 4 mmHg, preferencialmente 3 mmHg, por um período de tempo compreendido entre 20 minutos a 3 horas condicionado a configuração do desodorizador ou destilador utilizado .

[104] Em seguida, para evitar reações de oxidação lipídica ocorre o resfriamento sob vácuo (1 a 4 mbar) em uma temperatura que varia de 50 a 150 °C, preferencialmente 60 °C por um intervalo de tempo compreendido entre 15 e 30 minutos, preferencialmente em 30 minutos. Por fim, ocorre a filtração ( i4 ) em dispositivo de filtração para separação de qualquer material particulado (por exemplo, em filtro de polimento tipo "bag" ou, alternativamente, em filtros herméticos com vasos vertivais ou horizontais) .

[105] Consequentemente, em um segundo aspecto, a presente invenção se refere a uma gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , obtida conforme processo descrito acima, com composição de ácidos graxos heterogénea, variando de 4 a 24 carbonos ( C4 a C24), e ponto de fusão de 46°C (iniciando a fusão em 7 °C e finalizando em 52°C), a qual é capaz de estruturar produtos gordurosos, com maior resistência térmica (teor de gordura sólida a 25°C e residual de gordura sólida acima de 37 °C; temperatura corporal) quando comparada a GAL e sem a presença de gorduras trans.

[106] Estas características a diferenciam de qualquer óleo totalmente hidrogenado de origem vegetal e lhe conferem a capacidade de modular os processos de cristalização de diferentes sistemas lipídicos.

[107] A GALTH obtida de acordo com a presente invenção tem um amplo espectro de aplicação em diferentes áreas tecnológicas, devido sua composição em ácidos graxos e triacilglicerol únicas, a qual resulta em um perfil de fusão e cristalização atípico em ampla faixa de temperatura.

[108] A gordura anidra do leite (GAL) antes e após a hidrogenação total (GALTH) foram aquecidas a 70 °C e transferidas para tubos de vidro com tampa, que foram expostos a temperatura ambiente (25 ± 1 °C) , e acompanhadas durante 100 minutos, com a obtenção de imagens fotográficas. Após 15 horas de exposição, os tubos de vidro foram invertidos para determinar se as gorduras se apresentavam estruturadas ou fluídas.

[109] O processo de hidrogenação total modificou as propriedades de cristalização da gordura do leite. A GALTH, por conter triacilgliceróis de maior ponto de fusão e por ser totalmente saturada, iniciou o processo de cristalização por volta dos 10 minutos de exposição. Já a GAL, devido a sua diversidade de ácidos graxos e TAGs, a 25 °C esta é considerada uma gordura semi-sólida (ou seja, uma mistura de rede cristalina e óleo líquido) , o que resulta em um maior tempo para cristalizar.

[110] Somente após 60 minutos é possível observar (Figura 4) o início do processo de nucleação da gordura anidra do leite. As gorduras ficaram expostas durante 15 horas a 25 °C, e apesar da GAL ter induzido um processo de cristalização, esta temperatura não foi suficiente para mantê-la estruturada e sólida, diferente da GALTH que mesmo após a viragem do tubo, ela permanece sólida e estruturada. Esta característica, possibilita a aplicação desse novo material lipídico (GALTH) em sistemas que requerem estrutura, resistência térmica e estabilidade na temperatura ambiente, por exemplo na produção de chocolate ao leite que utiliza obrigatoriamente, gordura do leite em sua composição .

Testes realizados para caracterizar a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) :

[111] A fim de caracterizar a GALTH obtida pelo processo de hidrogenação total da gordura anidra do leite, foram utilizadas as metodologias analíticas citadas abaixo.

Conteúdo de gordura sólida:

[112] 0 conteúdo de gordura sólida foi determinado utilizando Espectrômetro de Ressonância Magnética Nuclear (RMN) de acordo com método AOCS Cd 16b- 93 (AOCS, 2009) .

[113] As amostras foram aquecidas durante 15 minutos a 100°C, mantidas a 60°C durante 5 minutos e estabilizadas a 0°C durante 1 hora utilizando um banho seco de alta precisão TCON 2000.

[114] As determinações foram realizadas em série, nas temperaturas de 10, 15, 20, 25, 30, 35, 40, 45, 50, 55, 60, 65 e 70 °C para gorduras não estabilizadas, e são mostradas nas Figuras 3.

[115] Os resultados obtidos são mostrados na Figura 3. Observa-se que óleos totalmente hidrogenados de origem vegetal, exceto o de palmiste, se mantêm totalmente sólidos em temperaturas abaixo de 50 °C, só se fundindo completamente entre 60 e 70°C.

[116] Já a GALTH, em qualquer uma das temperaturas avaliadas, apresenta-se com diferentes proporções de gordura líquida e gordura sólida, estando praticamente fundida na temperatura próxima da temperatura corporal .

[117] Cabe ressaltar que, embora o comportamento da GALTH seja semelhante àquele observado para o óleo totalmente hidrogenado de palmiste, a aplicação tecnológica desta gordura láurica é limitada devido ao seu elevado conteúdo de triacilgliceróis de 36 átomos de carbono, que em condições de hidrólise promove percepção sensorial de sabão. O limiar de percepção sensorial é extremamente baixo, assim, uma pequena concentração de ácido láurico livre (0,2-0, 5%) promove esse defeito de sabor.

Comportamento térmico de cristalização e fusão

[118] As curvas de cristalização e fusão foram determinadas por Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) com calibração por litio, conforme o método AOCS Cj 1-94 (AOCS , 2009) .

[119] Aproximadamente 10 mg de amostra foram pesadas em panelas de alumínio e recravadas hermeticamente. As curvas de cristalização foram realizadas nas seguintes condições: Temperatura inicial de 80°C por 30 minutos, seguida de resfriamento a uma taxa de 10°C / min até - 60°C e curva de fusão entre - 60 e 80°C por 30 minutos a uma taxa de 5°C / min .

[120] Os resultados obtidos são mostrados nas Figuras 2A e 2B. Especificamente, na Figura 2B, observa-se que a GALTH obtida na presente invenção funde parcialmente em 20°C e se funde totalmente a 52 °C, apresentando pico máximo de fusão a 46°C. O óleo de palmiste totalmente hidrogenado (OPtTH) se funde próximo de 40°C, enquanto os demais óleos totalmente hidrogenados de palma, soja e crambe (OPTH, OSTH e OCrTH, respectivamente ) se fundem entre 50 e 70°C.

Composição em ácidos graxos

[121] A composição em ácidos graxos foi determinada por cromatógrafo em fase gasosa equipado com um detector de ionização de chamas e com uma coluna capilar de sílica fundida. Os ésteres metílicos de ácidos graxos foram obtidos por transmetilação catalisada por base de acordo com Christie (1982) com modificações (Chouinard et ai., 1999) .

[122] As condições de operação foram as mesmas descritas por Cruz-Hernandez et ai. (2007) . A composição foi identificada pela comparação dos tempos de retenção com os padrões FAME de referência.

[123] A tabela 1 abaixo compara a composição em ácidos graxos da GALTH com a composição dos óleos totalmente hidrogenados de diferentes origens vegetais, sendo estas expressas em porcentagem em massa de ácidos graxos totais utilizando fatores de resposta relativos teóricos (Wolff et ai. , 1995) .

Tabela 1 - Composição em ácidos graxos (g / lOOg) do da GALTH e de diferentes óleos totalmente hidrogenados provenientes de óleo de palmiste (OPtTH) , óleo de palma (OPTH) , óleo de soja (OSTH) e óleo de crambe (OCrTH) .

Adaptado de Ribeiro; Basso; Kieckbusch (2013) ; Oliveira et al. (2015).

[124] A diferença de composição é evidente: enquanto a GALTH apresenta uma ampla variedade de ácidos graxos saturados com 4 a 24 átomos de carbono, os óleos vegetais totalmente hidrogenados de palmiste, palma, soja e crambe apresentam 6, 2, 2 e 4 diferentes ácidos graxos, respectivamente .

[125] Em geral, as propriedades físicas características destes óleos vegetais totalmente hidrogenados inviabilizam sua aplicação direta como base lipídica única, especialmente pela temperatura de fusão significativamente acima da temperatura corporal, em que basicamente todo o material lipídico encontra-se no estado sólido e não plástico. [126] Contrariamente, para a GALTH, a contribuição particular de ácidos graxos de cadeia curta e uma grande variedade de ácidos graxos com diferentes estruturas e tamanhos de cadeia resulta na formação de um material totalmente hidrogenado de ponto de fusão relativamente baixo e parâmetros gerais de cristalização extremamente diferenciados .

[127] Em um terceiro aspecto, a presente invenção se refere, ainda, ao uso da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) em produtos alimentícios, cosméticos e farmacêuticos, inclusive para a preparação de micropartículas lipídicas sólidas, bases lipídicas e Nanopartículas lipídicas (Nanopartículas lipídicas sólidas (NLS) e carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN) ) .

[128] A Figura 5 apresenta um esquema geral dos exemplos de concretização referente às aplicações da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) , que abrange os itens (I), (II) e (III) . Em (I) são apresentados os resultados de produção, caracterização e estabilidade de micropartículas lipídicas sólidas obtidas com a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e estocadas em diferentes temperaturas durante 60 dias. Em (II) está apresentado a elaboração e caracterização das bases lipídicas compostas de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) com óleo de girassol alto oleico (OGAO) ; e gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) com a própria gordura anidra do leite (GAL) , obtidas em diferentes proporções. Posteriormente, com base nos resultados obtidos em (II), foram selecionadas algumas bases lipídicas, que em (III), foram aplicadas no desenvolvimento de Nanopartículas lipidicas, compreendidas por Nanopartículas lipidicas sólidas (NLS) e carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN) , estabilizadas por proteínas lácteas. A estabilidade desses sistemas foi avaliada durante 90 dias de estocagem a 25 °C.

[129] Consequentemente, a presente invenção se refere a MICROPARTÍCULAS LIPÍDICAS SÓLIDAS (I), produzidas com a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) obtida na presente invenção, para serem aplicadas na modulação de processos de cristalização ( seeding) e/ou na veiculação de compostos bioativos, micro-organismos, probióticos e fármacos.

[130] As micropartículas lipidicas sólidas (I) obtidas nesta invenção apresentam características diferenciadas e aperfeiçoadas quando comparadas às micropartículas lipidicas sólidas já conhecidas do estado da arte e do mercado, tendo em vista que as micropartículas lipidicas obtidas somente com gorduras totalmente hidrogenadas não têm aplicação em alimentos devido seu elevado ponto de fusão. No entanto, a GALTH permite a obtenção de micropartículas totalmente sólidas, com ponto de fusão compatível com aplicação em alimentos, sem a necessidade de utilizar misturas com óleos vegetais. Além disso, o uso da GALTH permitiu a obtenção de micropartículas lipidicas totalmente de origem láctea.

[131] De forma geral, a Figura 6 apresenta um esquema referente aos exemplos de concretização para a produção das micropartículas lipidicas sólidas (I) . Inicialmente, a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) foi aquecida em estufa a 60 °C para completa fusão. A gordura foi adicionada em um recipiente com temperatura de entrada também a 60 °C, e sofreu pulverização em atomizador duplo fluido (diâmetro de 0,7 mm), aquecido a 60 °C e com pressão de 1 bar. A atomização foi efetuada em câmara resfriada (Ultratorac, LKB - Bromma, Germany) a 2 ± 0,5 °C. Após atomização, as micropartículas foram imediatamente acondicionadas em embalagens metalizadas especificas para material particulado e armazenadas em BOD a 5 °C para estabilização durante 24 horas. Após estabilização, as micropartículas foram divididas em três lotes e armazenadas em BOD durante 60 dias em três temperaturas diferentes: 05, 15 e 25 °C.

[132] O rendimento do processo foi calculado dividindo a massa do produto final (micropartículas lipidicas) pela massa da gordura inicial que deu entrada no recipiente (GALTH) . O resultado é expresso em unidade por cento em peso ( % , m/m) .

Caracterização das microparticulas lipidicas sólidas (I)

[133] Imediatamente após a produção (dia 0), as micropartículas lipidicas foram avaliadas quanto ao hábito polimórfico. Após 24h de estabilização a 5 °C, as micropartículas foram avaliadas quanto ao tamanho de partículas através de técnica de espalhamento de luz utilizando-se o equipamento Mastersizer 2000 conforme descrito por Consoli et al . (2016), com algumas modificações; morfologia determinada por microscopia eletrónica de varredura (MEV) , conforme metodologia descrita por Okuro et al . (2013); comportamento térmico de fusão determinado por Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) conforme o método AOCS Cj 1-94 (AOCS, 2009) ; e hábito polimórfico determinado por difração de raios-x pelo método AOCS Cj 2- 95 (AOCS , 2009) .

[134] Amostras aleatórias de micropartículas lipidicas foram retiradas após 07, 15, 30 e 60 dias de estocagem nas diferentes temperaturas (05, 15 e 25 °C) , totalizando 4 pontos de avaliação. Em cada ponto de amostragem as micropartículas foram avaliadas quanto ao tamanho de partículas, microscopia eletrónica de varredura, comportamento térmico de fusão e hábito polimórfico.

Caracterização das microparticulas lipidicas

[135] O processo de produção das micropartículas lipidicas obtidas pela técnica de Spray chilling, apresentou elevado rendimento, de 94,9 ± 2,2 % (m/m) . Após o processo de produção, as micropartículas apresentaram aspecto esférico e coloração branca, característica da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada. A Figura 7, apresenta o aspecto visual das micropartículas armazenadas em três temperaturas diferentes. O aspecto das micropartículas armazenadas a 05 °C é de um pó fino e disperso, diferente das armazenadas a 25 °C que apresentaram aparência granulada e pouco dispersa. E a 15 °C o aspecto foi intermediário as demais .

Tamanho médio e distribuição de tamanho de partícula

[136] A Figura 8 apresenta a distribuição de tamanho e o diâmetro médio das micropartículas lipidicas durante 60 dias de estocagem em três temperaturas diferentes. O menor diâmetro encontrado (120,4 mm) foi para as micropartículas armazenadas a 5 °C. O diâmetro médio aumentou conforme o aumento da temperatura de estocagem, sendo que as micropartículas armazenadas a 15 e 25 °C apresentaram 149,0 e 211,3 pm, respectivamente . [137] A 25 °C as micropartículas apresentaram maior diâmetro médio pois nesta temperatura a GALTH apresenta menor teor de gordura sólida quando comparado com as demais temperaturas. O maior teor de gordura liquida nas partículas pode facilitar a aderência de uma partícula em outra e possivelmente tendem a se aglomerar e aumentar de tamanho. Morfologia

[138] A Figura 9 apresenta as imagens obtidas por microscopia eletrónica de varredura das micropartículas lipídicas produzidas com GALTH, armazenadas a 05, 15 e 25 °C por 60 dias. Observa-se que em todas as condições, as micropartículas apresentaram formato esférico e superfície lisa. Em geral, nota-se que as micropartículas de menor tamanho se aderem à superfície das de maior diâmetro. A 25 °C as micropartículas apresentam-se mais aglomeradas, estando em consonância com o diâmetro médio, que está associada a aderência das partículas que não estão totalmente solidificadas nesta temperatura e por isso tendem a se juntar, formando os aglomerados.

Comportamento térmico de fusão

[139] Observa-se na Figura 10 o comportamento térmico de fusão das micropartículas lipídicas armazenadas a 05, 15 e

25 °C, respectivamente . Em todas as temperaturas estudadas, o comportamento térmico foi típico da gordura do leite, que devido sua complexa composição apresenta picos largos e com eventos térmicos segmentados. O primeiro evento de fusão corresponde aos triacilgliceróis compostos pelos ácidos graxos de cadeia curta e média. Já o segundo é resultante da fusão dos TAGs compostos por ácidos graxos saturados de cadeia longa. Independente da temperatura de armazenamento, todas as micropartículas apresentaram pico máximo de fusão próximo da 46 °C, que é condizente com o ponto de fusão da GALTH. A 25 °C, observa-se que os picos são mais estreitos, pois nesta temperatura parte dos triacilgliceróis de menor tamanho de cadeia já estão fundidos.

Polimorfismo

[140] A Figura 11 apresenta os perfis de difração de raios-x obtidos para as micropartículas lipidicas de GALTH, armazenadas a 05, 15 e 25 °C durante 60 dias. Observa-se que as micropartículas armazenadas a 05 °C apresentaram predominância do polimorfo b ' , e a tendência de formação de cristais b após 60 dias de estocagem (Figura 11a) . O hábito polimórfico b' é típico da gordura do leite devido sua diversidade de ácidos graxos que estruturam os seus triacilgliceróis (WRIGHT ; MARANGONI , 2006; 0'BRIEN, 2009) . Em geral, quanto maior a temperatura de estocagem, maior é a tendência de as micropartículas apresentarem cristais mais estáveis (LOPES et ai., 2015) . Quando armazenadas a 15 e 25 °C as micropartículas apresentaram um início de transição polimórfica para b ' sub b, o que significa que apesar do aparecimento da forma b, a forma b ' ainda se apresenta em maior intensidade.

[141] A presente invenção também se refere a obtenção de BASES LIPÍDICAS (II) compreendendo a gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) obtida na presente invenção, a serem aplicadas, isoladamente ou em conjunto com outros óleos e gorduras, para proporcionar maior resistência térmica e mecânica em produtos como chocolates, spreads, sopas, recheios de biscoito, massas e sorvete. Adicionalmente, podem ser aplicadas em chocolate ao leite em substituição total ou parcial da fase lipidica de base láctea. Podem ser misturadas com manteiga de cacau e sucedâneos, a exemplo de equivalentes, substitutos ou melhoradores . Aplicação como matéria-prima para obtenção de lipídios estruturados por interesterificação via química e enzimática. Obtenção de Nanopartículas lipídicas sólidas, nanocarreadores lipídicos (carreadores lipídicos nanoestruturados ) e nanoemulsões .

[142] As bases lipídicas (II) foram preparadas a partir de misturas de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e óleo de girassol alto oleico (GALTH:OGAO % m/m) e a partir de misturas de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e gordura anidra do leite (GALTH:GAL % m/m) nas proporções 100:0 (controle); 90:10; 80:20; 70:30; 60:40; 50:50 (Figura 12) . Foram preparadas 100 g de cada mistura, em triplicada de processo. Para o preparo das bases lipídicas, as gorduras foram aquecidas a 80 °C para completa fusão e em seguida foram misturadas com auxílio de um bastão de vidro para garantir completa homogeneização. Após completa fusão e homogeneização, as bases lipídicas foram armazenadas em estufa BOD a 5 °C até o momento das determinações analíticas. Metodologias analíticas para caracterização das bases lipídicas (II)

[143] As bases lipídicas foram caracterizadas quanto à composição em ácidos graxos determinada utilizando cromatógrafo em fase gasosa; conteúdo de gordura sólida, compatibilidade, ponto de fusão e isoterma de cristalização determinados por Espectrômetro de Ressonância Magnética Nuclear (RMN) de acordo com método AOCS (2009) ; comportamento térmico de cristalização e fusão determinados por Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) conforme método AOCS (2009) ; microestrutura avaliada por microscopia de luz polarizada; e hábito polimórfico determinado por difração de raios-x de acordo com método AOCS (2009) . O hábito polimórfico foi avaliado após 7 e 30 dias de estabilização a 25 °C.

[144] As bases lipidicas (II) obtidas nesta invenção apresentam caracteristicas diferenciadas e aperfeiçoadas quando comparadas às micropartículas lipidicas sólidas já conhecidas do estado da arte e do mercado tendo em vista que todas as bases lipidicas apresentaram compatibilidade total entre os constituintes. No geral, quando óleos são misturados com hardfats (gorduras totalmente hidrogenadas ) , pode ocorrer incompatibilidade, devido as diferenças químicas entre os constituintes. Essa incompatibilidade torna necessário o uso de métodos de modificação como a interesterificação, para viabilizar a aplicação tecnológica.

[145] Outro diferencial, é a ampla faixa de fusão e cristalização, resultado da composição química heterogénea proveniente da GALTH. Isso permite que nas temperaturas usuais de processamento, estocagem e consumo tenha sempre um equilíbrio de gordura liquida e gordura sólida. Outro diferencial reside na ausência de residual ceroso à temperatura corporal durante o consumo. Essas diferenças técnicas estão melhor detalhadas nos parágrafos 120-131. Composição em ácidos graxos

[146] A Tabela 2 apresenta a composição em ácidos graxos das bases lipidicas compostas de misturas de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e gordura anidra do leite (GALTH: GAL % m/m) e a partir de misturas de gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e óleo de girassol alto oleico (GALTH : OGAO % m/m) nas proporções 100:0 (controle); 90:10; 80:20; 70:30; 60:40; 50:50. O processo de hidrogenação total aplicado na gordura do leite resultou em uma gordura totalmente saturada, que corresponde a níveis superiores a 98% (0'BRIEN, 2009) . Os principais ácidos graxos encontrados na GALTH (100:0) são os ácidos miristico (C 14:0), palmitico (C 16:0) e esteárico (C 18:0) . A medida que se adicionou GAL ou OGAO à GALTH, resultou em bases lipidicas com significativa redução na concentração de ácidos graxos saturados (Figura 13) .

Conteúdo de gordura sólida , compatibilidade e ponto de fusão

[147] A Figura 14 apresenta o conteúdo de gordura sólida das bases lipidicas de GALTH: GAL (% m/m) GALTH: OGAO (% m/m) . O acréscimo de GAL e de OGAO à GALTH foi acompanhado da redução gradativa do teor de gordura sólida das bases lipidicas em diferentes temperaturas. A adição de OGAO, que é um óleo vegetal altamente insaturado e rico em ácido oleico (C 18:1), promoveu uma diferença mais acentuada no perfil de sólidos, quando comparada com a adição da própria gordura do leite à GALTH. Por exemplo, a 10 °C todas as bases lipidicas de GALTH: GAL apresentaram valores de conteúdo de gordura sólidas com pouca variação, entre 89 a 72 %. Já na mesma temperatura, a medida que aumentou o teor de OGAO à GALTH, essa diferença variou entre 89 e 39 %. Essa diferença está relacionada devido ao aumento da concentração de triacilgliceróis de baixo ponto de fusão nas bases lipidicas contendo óleo de girassol alto oleico.

[148] Todas as bases lipidicas desenvolvidas neste estudo podem ser classificadas como gorduras resistentes à exsudação de óleo, porque contêm mais de 10% de gordura sólida a 20 °C. Além disso, todas as bases são capazes de conferir estrutura a produtos à base de lipídeos, com características de fusão apropriadas à temperatura corporal, uma vez que possuem gordura cristalizada acima de 25 ° C.

[149] A redução do teor de gordura sólida foi acompanhada da redução do ponto de fusão das bases lipidicas, conforme observado na Tabela 3. O ponto de fusão em geral reduziu de 46 para 40 °C aproximadamente . Essa redução deveu-se a redução dos triacilgliceróis (TAGs) compostos de ácidos graxos saturados de alto ponto de fusão, provenientes da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada e do aumento dos triacilgliceróis di e triinsaturados provenientes da GAL e do OGAO. No entanto, praticamente não houve diferença entre a adição de GAL ou a adição de OGAO. Indepentende da proporção ou do tipo de mistura, a GALTH apresentou capacidade de co-cristalizar com as outras matérias-primas, governando a cristalização das bases lipidicas.

[150] O estudo da compatibilidade entre os componentes das bases lipidicas (Figura 15), demonstrou uma evolução linear em todas as temperaturas estudadas, o que caracteriza as bases lipidicas com compatibilidade total entre a GALTH e a GAL, e entre a GALTH e o OGAO, com formação de soluções sólidas continuas (TIMMS, 1984) . Essa compatibilidade é devido à solubilidade no estado sólido das moléculas de triacilglicerol das bases lipidicas, sugerindo uma co- cristalização entre entre os componentes, o que caracteriza a estabilidade de gorduras plásticas.

Comportamento térmico de cristalização e fusão

[151] A Figura 16 apresenta os termogramas de cristalização das bases lipidicas compostas de GALTH:GAL e de GALTH:OGAO (m/m %) . Nota-se claramente dois eventos de cristalização. No primeiro evento, os TAGs de alto ponto de fusão se associam e co-cristalizam, enquanto que os TAGs de médio e baixo ponto de fusão cristalizam no segundo evento térmico .

[152] Quanto ao comportamento térmico de fusão, observa- se na Figura 17 que a GALTH (100:0) apresentou dois picos de fusão bem definidos, porém largos, devido sua heterogeneidade de TAGs. O primeiro pico inicia sua fusão em 7,48 °C e finaliza em 32,26 °C, e corresponde aos triacilgliceróis compostos pelos ácidos graxos de cadeia curta e média. Já o segundo pico inicia em 34,34 e finaliza em 52,56 °C, resultante da fusão dos TAGs compostos por ácidos graxos saturados de cadeia longa. A adição de GAL à GALTH modificou o comportamento de fusão das bases lipidicas, tornando os eventos de fusão mais largos e heterogéneos, devido a complexa composição da GAL. E com a adição de OGAO à GALTH, houve o aparecimento de um segundo pico de fusão nas bases lipidicas, que representa a fusão dos TAGs triinsaturados provenientes do óleo de girassol alto oleico, que inicia sua fusão próximo de -14 °C.

Isoterma de cristalização

[153] O estudo da cristalização das bases lipidicas é apresentado na Figura 18 através das isotermas de cristalização a 25 °C. Observa-se que as curvas obtidas para todas as bases lipidicas apresentaram duas fases distintas de aumento rápido do conteúdo de gordura sólida. A primeira fase foi formada após o tempo de indução, que foi menor para a GALTH (controle) (7,00±0,58 min) do que para as demais bases lipídicas. Em seguida observou-se a formação de um platô e outra fase de aumento rápido do conteúdo sólida antes de atingir o equilíbrio no ponto máximo de cristalização. A formação do platô pode ser resultado de um período de transição polimórfica da forma cristalina menos estável (a) para uma mais estável (b') (FOUBERT et ai., 2006) .

[154] Observa-se ainda que tanto a adição de GAL, quanto a adição de OGAO, reduziram o teor máximo de gordura sólida após os 120 minutos expostos a 25 °C. Este efeito se deve à redução da concentração de TAGs trissaturados de maior ponto de fusão nas bases lipídicas.

Mi croestrutura

[155] As Figuras 19 e 20 apresentam visualmente a rede cristalina das bases lipídicas. As imagens são apresentadas a 25 e 40 °C, para melhor identificação da morfologia dos cristais. Ao reduzir o teor de GALTH nas bases, observa-se que a % de área cristalizada e a densidade da rede cristalina diminuíram gradativamente. Observa-se que os cristais formados se apresentam como cristais esferulitos. A adição de OGAO à GALTH nas proporções acima de 30%, ocasionou uma redução no número de elementos cristalinos e um aumento de tamanho dos cristais (Figura 20), devido o maior teor de gordura líquida na rede cristalina, que gera maior espaço para o crescimento dos cristais.

Observação visual

[156] A Figura 21 apresenta um esquema visual de como as bases lipídicas se comportam quando expostas à temperatura ambiente. Todas as bases lipídicas foram fundidas na mesma temperatura e em seguida foram expostas durante 120 minutos a 25 °C. Observa-se que após 20 minutos de exposição, as bases lipídicas que apresentam maior teor de GALTH se apresentam parcialmente cristalizadas, com processo de nucleação e crescimento dos cristais. Após 120 minutos, independente do tipo de mistura ou da proporção da mistura, todas as bases lipídicas se apresentaram sólidas e estruturadas. Este efeito comprova a capacidade estruturante da GALTH, que foi capaz de aprisonar até 50 % de óleo de girassol alto oleico na rede cristalina, sem exsudação de óleo .

48/61

Polimorfismo

[157] A Figura 22 apresenta os difratogramas das bases lipidicas após 07 e 30 dias de estabilização a 25 °C, respectivamente . Após 30 dias de estabilização, o hábito polimórfico das bases não foi alterado e os triacilgliceróis de todas as bases lipidicas cristalizaram na forma b' . O hábito polimórfico b' da gordura do leite se deve a diversidade de ácidos graxos que estruturam os seus triacilgliceróis (WRIGHT ; MARANGONI , 2006; 0'BRIEN, 2009) . Contrariamente, o óleo de girassol alto oleico, apresenta tendência de formação de cristais na forma b, em função de sua composição majoritária em ácido oleico (ACEVEDO e MARANGONI, 2010) . Adições de até 50 % de OGAO à GAL não afetaram o seu hábito polimórfico de cristalização, ou seja, prevaleceu a forma b' , que é desejável tecnologicamente e isso está relacionado possivelmente aos teores de ácido palmitico das bases lipidicas . Consequentemente, a presente invenção se refere também a nanopartículas lipidicas (III) a partir de GALTH e bases lipidicas estabilizadas por proteínas lácteas usadas como emulsificantes, incluindo Nanopartículas Lipidicas Sólidas (NLS) e Carreadores Lipídicos Nanoestruturados (CLN) .

[158] Os emulsificantes utilizados para o preparo das nanopartículas lipidicas (NL) foram o isolado proteico do soro (WPI, conteúdo de proteína de 92,03 ± 0,18%) e caseinato de sódio (NaCas, conteúdo de proteína de 92,51 ± 1,87%) gentilmente cedidos pela Arla Foods (Videbaek, Denmark) .

[159] Foram selecionados 5 sistemas lipídicos de (II) para serem aplicados na formulação das NL . A Tabela 4 apresenta as formulações das bases lipidicas utilizadas para obtenção das nanopartículas lipidicas sólidas (NLS) e carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN) . Além disso, foram utilizados água ultrapura MiliQ e todos os demais reagentes utilizados para o preparo de soluções foram de pureza analítica.

Tabela 4 . Formulações das bases lipidicas utilizadas na obtenção das nanopartículas lipidicas sólidas (NLS) e carreadores lipidicos nanoestruturados (CLN) e suas respectivas somatória de ácidos graxos saturados e insaturados (%) e ponto de fusão (°C) .

GALTH: Gordura anidra do leite totalmente hidrogenada; OGAO: Óleo de girassol alto oleico; e GAL: Gordura anidra do leite Resultados referentes às nanoparticulas lipidicas (III)

Preparo das soluções de proteínas e das emulsões

[160] As soluções aquosas de 2% (p/p) foram preparadas dissolvendo-se as proteínas lácteas (WPI ou NaCas) em água MiliQ. As soluções foram mantidas sob agitação magnética por 1 hora a temperatura ambiente (~ 25 °C) . Azida sódica (0,02%) foi adicionada em todas as soluções como agente antimicrobiano e as soluções foram armazenadas sob refrigeração (5-7 °C) durante uma noite para permitir a completa hidratação das proteínas. Preparo das nanopartículas lipídicas (NLS)

[161] A Figura 23 apresenta um esquema das formulações das nanopartículas lipídicas obtidas na presente invenção. Foram elaborados dois conjuntos de NL, um utilizando WPI como emulsificante e os cinco tipos de bases lipídicas citados anteriormente, e o outro conjunto, utilizando NaCas com as mesmas bases lipídicas, totalizando 10 tipos distintos de NL . Cada tratamento foi elaborado com três repetições de processo .

[162] Para o preparo das pré-emulsões a fase lipídica foi aquecida a 60 °C e adicionada lentamente à fase aquosa também aquecida a 60 °C. As misturas foram submetidas à agitação contínua por 5 minutos a 15.000 rpm, utilizando-se agitador Ultra Turrax modelo T18 (IKA, Germany) . As pré- emulsões foram submetidas à homogeneização a alta pressão a quente, em um homogeneizador de dois estágios FBF BÚFALO HOMOLAB 2.20. Foram realizados 3 ciclos de homogeneização, utilizando 800 bar de pressão no primeiro estágio e 50 bar de pressão no segundo estágio. As nanoemulsões obtidas foram resfriadas a 5 °C por 24 horas para cristalização da fase lipídica para obtenção das dispersões das nanopartículas lipídicas e subsequentemente estocadas em câmara BOD a temperatura de 25 °C para o estudo de estabilidade durante 90 dias (KUMBHAR e POKHARKAR, 2013; QIAN et al . , 2013; YANG et al . , 2014 ) .

[163] As nanopartículas lipídicas obtidas nesta invenção apresentam características diferenciadas e aperfeiçoadas quando comparadas às micropartículas lipídicas sólidas já conhecidas do estado da arte tendo em vista que não existe na literatura NLS obtidas somente com gordura do leite. A gordura do leite no seu estado natural não viabiliza a obtenção de NLS . As NLS são produzidas somente com gorduras totalmente saturadas, como a obtida na presente invenção. Além disso, o diferencial foi produzir nanopartículas exclusivamente de fontes lácteas, utilizando a GALTH e a gordura anidra do leite como fonte lipidica e as proteínas lácteas como emulsificantes . As nanopartículas lipidicas obtidas apresentaram elevada estabilidade ao longo de 90 dias de estocagem a 25 °C.

Caracterização das nanoparticulas lipidicas (NL)

[164] As NL foram caracterizadas quanto a distribuição de tamanho e diâmetro médio analisados através de técnica de espalhamento de luz utilizando-se o equipamento Mastersizer 2000; estabilidade cinética utilizando equipamento Turbiscan ASG; conteúdo de gordura sólida a 25 °C utilizando ressonância magnética nuclear (RMN) ; comportamento térmico de fusão e recristalização determinados por Calorimetria Diferencial de Varredura (DSC) e polimorfismo por difração de raios-x.

Distribuição de tamanho e diâmetro médio

[165] A distribuição de tamanho e o diâmetro médio das partículas estão apresentados na Figura 24. O tempo de armazenamento não afetou o diâmetro das nanopartículas. As nanopartículas lipidicas sólidas (NLS) em que a fase lipidica é composta unicamente por GALTH, apresentaram o menor diâmetro médio (135,6 e 140,3 nm, para WPI e NaCas, respectivamente ) . Já os carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN) , em que a fase lipidica foi modificada pela adição de triacilgliceróis insaturados provenientes da GAL ou do OGAO, nota-se que houve um aumento no diâmetro médio. Porém todos os tratamentos apresentaram diâmetro médio inferior a 200 nm, o que as classificam como nanopartículas .

Comportamento térmico de fusão e recristalização

[166] A Figura 25 apresenta o comportamento térmico de fusão e recristalização das nanopartículas lipidicas. Todos tratamentos apresentaram um único pico de fusão, que iniciou por volta de 25 °C. Este pico é proveniente dos TAGs de alto ponto de fusão, compostos por ácidos graxos saturados e de cadeia longa. Diferente das nanopartículas obtidas somente com GALTH, as nanopartículas em que a fase lipidica foi modificada pela adição de triacilgliceróis insaturados provenientes da GAL ou do OGAO apresentaram um menor gasto de energia para fundir e um baixo índice de recristalização. Esse efeito ocorre, pois, nesta temperatura de armazenamento (25 °C) , os TAGs de menor ponto de fusão encontram-se líquidos, portanto, quanto menor o teor de ácidos graxos saturados na fase lipidica, menor será seu índice de recristalização.

Conteúdo de gordura sólida

[167] O conteúdo de gordura sólida a 25 °C das nanopartículas lipidicas é apresentado na Figura 26. As nanopartículas formuladas com GALTH apresentaram maior conteúdo de gordura sólida, enquanto que as nanopartículas contendo 50 % de óleo de girassol apresentaram baixo teor de gordura sólida. Estes resultados corroboram com o comportamento térmico discutido anteriormente, visto que a 25 °C grande parte da fase lipidica encontra-se fundida (gordura líquida) .

Estabilidade cinética [168] A Figura 27 apresenta as mudanças no perfil de espalhamento de luz (ABS) das nanopartículas em função da altura do tubo, em diferentes tempos de avaliação. As nanopartículas compostas somente de GALTH não apresentaram nenhum mecanismo de desestabilização . Já para as demais nanopartículas, observa-se um aumento na desestabilização ao longo do tempo de armazenamento. Ou seja, existe uma diminuição do backscattering na parte inferior do tubo e um aumento concomitante do backscatteríng na zona superior, atribuída a formação de uma camada creme. As nanopartículas compostas de GALTH : OGAO 50:50 com WPI foram consideradas as mais instáveis. Este resultado pode ser correlacionado com a distribuição de tamanho e o diâmetro médio das gotículas. Partículas maiores apresentam uma maior taxa de migração. Este efeito pode ser também visualizado na Figura 28, que apresenta a variação dos valores de TSI ( Turbiscan Stability Index) em função do tempo. Um valor mais alto de TSI indica uma emulsão menos estável. Observa-se que somente as nanopartículas compostas por 50 % de óleo de girassol alto oleico apresentaram um efeito linear. As demais nanopartículas apresentaram-se estáveis aos níveis de TSI ao longo do tempo de armazenamento, demonstrando que as proteínas do leite foram capazes de estabilizar as nanopartículas lipídicas durante 90 dias a 25 °C.

[169] Apesar de algumas nanopartículas apresentarem indícios de desestabilização, observa-se na Figura 29, que todas amostras apresentaram aspecto estável, sem separações de fase visíveis.

Polimorfismo

[170] A Figura 30 apresenta os difratogramas de raios- x obtidos a 25 °C. Observa-se que as nanopartículas compostas somente por gordura do leite apresentaram hábito polimórfico b ' e b na mesma proporção, que são caracterizados por short spacings a 4,5 Å (polimorfo b) e 4,2 e 3,8 Å (polimorfo b ' ) . Já as nanopartículas compostas por misturas de GALTH com OGAO apresentaram cristais mais estáveis, caracterizados por short spacíngs a 4,5, 3,8 e 3,7 Å (polimorfo b) .

[171] Os versados na arte valorizarão os conhecimentos aqui apresentados e poderão reproduzir a invenção nas modalidades apresentadas e em outras variantes, abrangidas no escopo das reivindicações anexas.

Produção de chocolate ao leite com aplicação da gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) (IV) .

[172] O chocolate ao leite foi fabricado segundo formulação disponível na Tabela 1, e foi baseada na Legislação da União Europeia (2000/36/EC) e no Projeto de Lei do Brasil (PL 10247/2018) . As etapas de processamento incluíram preparo da mistura, refino, conchagem, temperagem, moldagem, resfriamento e desmoldagem. Para efeito de controle e comparação, foi fabricado um chocolate ao leite padrão adicionado de Gordura Anidra do Leite (GAL) .

Tabela 1 : Formulação de chocolate ao leite padrão e chocolate ao leite com gordura de leite modificada.

MC:GAL e MC:GALTH

[173] Os testes foram realizados com o intuito de estudar a compatibilidade e as possíveis interações entre os triacilgliceróis da manteiga de cacau (MC) e da gordura do leite em sua forma padrão (GAL) ou modificada (GALTH) . As faixas de concentração estudadas foram de 0 a 100 % (m/m) de misturas binárias de MC : GAL e MC: GALTH. A GAL e GALTH foram fundidas a 60 °C por 10 min e adicionadas à manteiga de cacau líquida sob agitação, para garantir sua completa dispersão na fase oleosa. Uma comparação entre os dois sistemas (MC: GAL e MC:GALTH) foi realizada para avaliar as interações entre os triacilgliceróis dos componentes das misturas. Essa avaliação foi realizada através dos diagramas de compatibilidade obtidos a partir dos dados de conteúdo de gordura sólida fornecidos experimentalmente por ressonância magnética nuclear (RMN) .

[174] A avaliação da compatibilidade entre os componentes das misturas binárias de MC : GAL e MC: GALTH (Figura 32a e 32b) demonstrou que em baixos níveis de adição (até 20%) de gordura do leite (GAL ou GALTH), houve a formação de soluções sólidas contínuas, demonstrando que nessas proporções as misturas binárias são compatíveis. Por outro lado, acima de 20% de adição, observou-se uma evolução não linear na maioria das temperaturas avaliadas, o que caracteriza essas bases lipídicas com incompatibilidade entre a MC e a GAL (Figura 32a) e entre a MC e a GALTH (Figura 32b) . A complexa diferença entre os triacilgliceróis da manteiga de cacau e da gordura do leite foram responsáveis pela interação eutética e solubilidade limitada na fase sólida das misturas binárias.

[175] Os resultados obtidos nesta etapa inicial do aperfeiçoamento sugerem que a gordura do leite totalmente hidrogenada por apresentar maior teor de gordura sólida e maior ponto de fusão, pode ser uma alternativa a ser adicionada na formulação de chocolate ao leite, visto que sua adição causou consequentemente menor efeito no amolecimento da manteiga de cacau.

Parte II - Caracterização das propriedades físicas e químicas das misturas compatíveis

[176] Os sistemas compatíveis foram caracterizados quanto as propriedades físicas tais como conteúdo de gordura de sólida, cinética de cristalização, comportamento térmico de cristalização, microestrutura e polimorfismo. Com base nessas características foi selecionada uma mistura para fabricação do chocolate.

[177] Os resultados das propriedades físicas das misturas binárias de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite (GAL) e de manteiga de cacau (MC) com gordura anidra do leite totalmente hidrogenada (GALTH) são apresentados nas Figuras 22, 34, 35, 36 e 37. De modo geral, a adição de gordura do leite (GAL) amoleceu a manteiga de cacau, sem modificar suas caracteristicas de cristalização. Por outro lado, a gordura do leite modificada (GALTH) acelerou o processo de cristalização do sistema lipidico, devido à natureza mais saturada dos seus triacilgliceróis .

[178] Ao comparar os sistemas de MC:GALTH 90:10 e MC: GALTH 80:20 observa-se que a adição de 20% de GALTH afetou drasticamente, a ponto de retardar a cristalização da MC. No entanto, a adição de 10% foi suficiente para modificar a cristalização da MC atuando como "semente de cristalização". Com base nesses resultados, a mistura 90:10 foi selecionada para compor a formulação de chocolate ao leite que será apresentado na sequência (Etapa III) .

Parte III - Produção de chocolate ao leite com gordura anidra do leite (padrão) e com modulador lipidico (GALTH)

[179] O chocolate ao leite foi fabricado segundo formulação disponível na Tabela 1, e foi baseada na Legislação da União Europeia (2000/36/EC) e no Projeto de Lei do Brasil (PL 10247/2018) . As etapas de processamento incluíram preparo da mistura, refino, conchagem, temperagem, moldagem, resfriamento e desmoldagem. Para efeito de controle e comparação, foi fabricado um chocolate ao leite padrão adicionado de GAL .

Tabela 1. Formulação de chocolate ao leite padrão e chocolate ao leite com gordura do leite modificada.

[180] A estocagem dos chocolates foi realizada de duas maneiras distintas, sendo (1) Estocagem sob ciclização térmica durante 28 dias (24h a 20 °C e 24h a 33 °C) ; e (2) Estocagem sob condição controlada a 20 °C durante 180 dias.

[181] Para ambas as estocagens, os chocolates produzidos foram caracterizados quanto ao índice de brancura, tensão de ruptura (snap), comportamento térmico de fusão, microestrutura e polimorfismo.

- Estocagem sob ciclização térmica

[182] A gordura do leite totalmente hidrogenada (GALTH) reduziu a mobilidade molecular da manteiga de cacau no chocolate ao leite, evitando a formação de fat bloom.

[183] Observa-se na Figuras 38 e na Figura 43 que o chocolate adicionado de GALTH mesmo após intensa ciclização térmica, não apresentou mudanças em relação ao índice de brancura e a formação de fat bloom. Estes resultados demonstram o potencial tecnológico da gordura do leite modificada e patenteada para resolver um problema real da indústria de chocolate.

Estocagem controlada a 20 °C [184] No momento, os chocolates estocados a 20 °C sob condição controlada, estão sendo ainda avaliados. O que se pode dizer é que até o momento (90 dias de estocagem) nenhuma das duas formulações apresentaram fat bloom (Figura 44) .